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sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Capitulo 20

Você não é Moroi!” ele continuou. Não estava gritando, mas nós certamente havíamos conseguido chamar a atenção das pessoas ao nosso redor. “Você é Rose Hathaway, não é? Como você e seu sangue impuro e atrevem a invadir a santidade de nosso-”

“Já basta,” uma voz calma disse de repente. “Eu tomo conta disso daqui por diante.”

Mesmo com o rosto coberto, não havia como não reconhecer aquela voz. Tatiana saiu de detrás do homem, vestindo uma máscara florida prateada e um vestido de manga longa cinza. Eu devia ter visto ela antes na multidão sem perceber. Até falar, ela se misturou aos outros.

O salão todo estava quieto agora. Daniella Ivashkov apareceu atrás de Tatiana, os olhos se arregalando por trás da máscara quando ela me reconheceu. “Adrian-” ela começou.

Mas Tatiana estava tomando conta da situação.. “Venha comigo.”

Não havia dúvida de que a ordem era para mim ou que eu iria obedecer. Ela se virou e caminhou elegantemente até a entrada do salão. Eu corri atrás dela, como fizeram Adrian e Daniella.

Assim que estávamos fora do hall iluminado por tochas, Daniella se virou para Adrian. “No que estava pensando? Você sabe que não me importo que traga Rose para certos eventos, mas isso foi-”

“Impróprio,” disse Tatiana rapidamente. “Embora, talvez seja bom para uma dhampir ver como os sacrifícios de seu povo são respeitados.”

Isso nos chocou tanto que passamos um momento em silêncio. Daniella se recuperou primeiro. “Sim, mas a tradição diz que-”

Tatiana a interrompeu novamente. “Estou bem ciente da tradição. É um ramo ruim de etiqueta, mas Rosemarie estar aqui certamente não arruina nossos planos. Perder Priscilla...” Tatiana não engoliu aquilo, propriamente dito, mas ela perdeu parte de sua compostura normal. Eu nunca imaginei alguém como ela tendo uma melhor amiga, mas Priscilla havia sido. Como eu agiria se perdesse Lissa? Não tão controlada, nem de longe. 25 mai ?Rafaela?

Eu aquiesci, ainda surpresa por Tatiana não estar berrando para que eu saísse. “É uma grande perda,” eu disse. “E deixa a situação pior, porque são os números que mais nos prejudicam – principalmente quando Strigoi formam grupos grandes. Não podemos vencer isso sempre.”

Tatiana concordou, parecendo agradavelmente surpresa que nós concordássemos em algo. Isso fazia duas de nós. “Eu sabia que entenderia. Mesmo assim...” Ela se voltou para Adrian. “Você não devia ter feito isso. Algumas linhas de propriedade precisam ser mantidas.”

Adrian estava surpreendentemente fraco. “Desculpe, tia Tatiana. Eu só achei que era algo que Rose podia ver.”

“Você vai guardar isso para si mesmo, não vai?” perguntou Daniella, voltando-se para mim. “Muitos dos convidados são muito, muito conservativos. Eles não iam querer que isso vazasse.”

Que eles se encontraram ao redor da fogueira e brincaram de fantasia? É, eu podia ver por que eles queriam guardar segredo.

“Não vou contar a ninguém,” eu assegurei.

“Bom,” disse Tatiana. “Agora, você devia sair antes que – aquele é Christian Ozera?” Seus olhos se voltaram para o salão lotado.

“Sim,” dissemos tanto eu quanto Adrian.

“Ele não foi convidado,” exclamou Daniella. “Isso é culpa sua também?”

“Não é tanto minha falta quanto é minha genialidade,” disse Adrian.

“Eu duvido que qualquer um vá saber, desde que ele se comporte,” disse Tatiana com um suspiro. “E eu tenho certeza de que ele usaria qualquer oportunidade que tenha para falar com Vasilisa.”

“Ah,” eu disse, sem pensar. “Não é a Lissa.” Lissa tinha dado as costas para Christian e estava falando com outra pessoa enquanto olhava ansiosa para mim da porta.

“Quem é?” perguntou Tatiana.

Merda. “É, hm, Mia Rinaldi. É uma amiga nossa de St. Vladimir.” Eu pensei em mentir e dar a ela um nome de realeza. Algumas famílias eram tão grandes que era impossível saber todos eles. 25 mai ?Rafaela?

“Rinaldi.” Tatiana gemeu. “Eu acho que conheço um servente com esse nome.” A verdade é que eu fiquei bem impressionada que ela soubesse quem trabalhava para ela. Mais uma vez, minha opinião dela mudou.

“Um servente?” perguntou Daniella, lançando ao filho um olhar de aviso. “Tem mais alguém que eu devia saber?”

“Não. Se eu tivesse tido mais tempo, provavelmente teria colocado Eddie aqui. Diabos, quem sabe até a Jailbait.”

Daniella pareceu escandalizada. “Você acabou de dizer Jailbait?”

“É só uma piada,” eu disse apressadamente, não querendo fazer essa situação ficar ainda pior. Tinha medo de como Adrian responderia. “É como chamamos nossa amiga Jill Mastrano de vez em quando.”

Nem Tatiana nem Daniella pareciam achar que isso era uma piada.

“Bom, ninguém parece pertencer que eles estão fora de seus devidos lugares,” disse Daniella, acenando com a cabeça em direção a Christian e Mia. “Embora não haja dúvidas de que as fofocas sobre como Rose interrompeu este evento vão se espalhar.”

“Desculpe,” eu disse, me sentindo mal pela possibilidade de ter colocado ela em confusão.

“Não há nada para se fazer sobre isso agora,” disse Tatiana em um tom cansado. “Você devia partir agora que todos pensam que foi repreendida severamente. Adrian, volte conosco e se certifique de que nenhum de seus outros 'convidados' atrairão atenção alguma. E não faça algo assim de novo.”

“Não farei,” disse ele, quase soando convincente.

Os três começaram a dar as costas, me deixando para que sumisse dali, mas Tatiana parou e olhou para mim. “Errado ou não, não se esqueça do que viu aqui. Nós realmente precisamos de guardiões.”

Eu assenti, um jorro de orgulho me percorrendo pelo reconhecimento dela. Então, ela e os outros voltaram ao salão. Eu os observei ansiosamente, odiando o fato de todos lá dentro pensarem que eu fui chutada de lá em desgraça. Considerando que podia ter sido muito pior, eu resolvi levar em conta as vantagens. Tirei a máscara, não tendo mais o que esconder, e fiz a caminhada de volta para o primeiro andar e para a rua.

Não tinha ido muito longe quando alguém surgiu diante de mim. Era um sinal de minha preocupação como eu quase saltei três metros.

“Mikhail,” exclamei. “Você me matou de susto. O que está fazendo aqui?”

“Na verdade, estava procurando você.” Ele parecia ansioso, nervoso. “Eu fui no seu prédio antes, mas você não estava lá.”

“É, eu estava no Masquerade of the Damned.”

Ele me olhou com uma expressão vazia.

“Esquece. O que houve?”

“Eu acho que podemos ter uma chance.”

“Chance de quê?”

“Ouvi dizer que você tentou ver Dimitri hoje.”

Ah, sim. O assunto que eu definitivamente queria pensar mais a respeito. “É. 'Tentou' é bem otimista. Ele não quer mais me ver, nem preciso me preocupar com o exército de guardiões me mantendo aqui fora.”

Mikhail se remexeu desconfortável, olhando em volta como um animal assustado. “É por isso que eu vim atrás de você.”

“Ok, eu realmente não estou entendendo nada disso.” Eu também estava começando a ficar com dor de cabeça por causa do vinho.

Mikhail respirou fundo e exalou. “Acho que posso colocá-la lá dentro.”

Eu esperei um instante, me perguntando se havia uma frase de efeito chegando ou se era tudo uma ilusão nascida de minhas emoções fragilizadas. Não. O rosto de Mikhail estava mortalmente sério, e embora eu não o conhecesse assim tão bem, eu já havia percebido que ele nunca fazia piadas.

“Como?” eu perguntei. “Eu tentei e-”

Mikhail acenou para que eu o seguisse. “Venha e eu explico. Não temos muito tempo.” 25 mai ?Rafaela?

Eu não pretendia desperdiçar qualquer chance que aparecesse, então corri atrás dele. “Alguma coisa aconteceu?” eu perguntei, assim que consegui acompanhar suas passadas largas. “Ele... ele pediu que eu fosse lá?” Era mais do que eu me atrevia a esperar. A forma como Mikhail falou a palavra “colocar” não ajudava muito.

“Eles aliviaram a guarda dele,” Mikhail explicou.

“Mesmo? Quanto?” Havia aproximadamente uma dúzia lá quando Lissa visitou, inclusive sua escolta. Se eles decidiram que só precisavam de um ou dois guardiões para Dimitri, seria um indicativo de que todos estavam entendendo que ele não era mais um Strigoi.

“Mais ou menos cinco.”

“Ah.” Não era ótimo. Não era horrível. “Mas eu posso crer que até isso significa que eles estão mais perto de acreditar que ele é inofensivo agora?”

Mikhail deu de ombros, mantendo os olhos no caminho a nossa frente. Havia chovido durante a Death Watch e o ar, ainda úmido, havia esfriado um pouco. “Alguns guardiões, sim. Mas será necessário um decreto real do Conselho para declarar o que ele é.”

Eu quase parei ali mesmo. “Declarar o que ele é?” eu exclamei. “Ele não é um 'o que'! Ele é uma pessoa. Um dhampir como nós.”

“Eu sei, mas está fora de nossas mãos.”

“Você está certo. Desculpe,” eu murmurei. Não havia sentido em atirar no mensageiro. “Bem, eu espero que eles movam suas bundas para decidir de uma vez.”

O silêncio que veio a seguir dizia muito. Eu lancei um olhar afiado para Mikhail.

“O quê é? O que você não está me contando?” eu exigi.

Ele se encolheu. “O rumor é que tem algo importantíssimo sendo discutido no Conselho atualmente, algo prioritário.”

Aquilo também me irritou. O que nesse mundo podia ser mais importante que Dimitri? Calma, Rose. Fique calma. Não deixe a escuridão piorar as coisas. Eu sempre tentei deixá-la escondida, mas aquilo frequentemente perdia o controle quando eu ficava muito estressada. Sim, estavam sendo dias bem estressantes. Eu voltei ao tópico anterior. 25 mai ?Rafaela?

Chegamos ao prédio prisional, e eu subi as escadas dois degraus de cada vez. “Mesmo que tenham aliviado os guardiões de Dimitri, eles ainda não me deixarão entrar. Os que estão lá agora sabem que fui ordenada a me manter longe.”

“Um amigo meu está com o turno da entrada agora. Não teremos muito tempo, mas ele dirá aos guardiões da área das celas que você estava autorizada a entrar.”

Mikhail estava prestes a abrir a porta quando eu o impedi, colocando a mão em seu braço. “Por que está fazendo isso por mim? O Conselho Moroi pode não achar Dimitri importante, mas os guardiões acham. Você podia se meter em uma encrenca danada.”

Ele olhou para mim, de novo com aquele sorriso pequeno e amargo. “Você precisa perguntar?”

Pensei sobre o assunto. “Não,” eu disse gentilmente.

“Quando eu perdi Sonya...” Mikhail fechou os olhos pelo tempo de uma batida cardíaca e, quando os abriu, eles pareciam estar vendo o passado. “Quando a perdi, eu não queria mais viver. Ela era uma boa pessoa – de verdade. Ela virou Strigoi por desespero. Não havia outro modo de se salvar do espírito. Eu daria qualquer coisa –

qualquer – por uma chance de ajudá-la, de consertar as coisas entre nós. Não sei se isso será possível algum dia, mas é possível para você no momento. Não posso deixá-la perder isso.”

Com isso, ele nos deixou entrar e, de fato, havia outro guardião ali. Exatamente como Mikhail falou, ele foi lá embaixo dizer aos outros que Dimitri tinha visita. O amigo de Mikhail parecia nervosíssimo por causa disso, o que era compreensível. Ainda assim, ele estava disposto a ajudar. Era incrível. Eu fiquei pensando no que amigos podem fazer uns pelos outros. Essas últimas semanas foram prova inegável disso. 25 mai ?Rafaela?

Como na visita de Lissa, dois guardiões vieram me escoltar escada abaixo. Eu os reconheci de quando estive na mente dela, e eles pareciam surpresos em me ver. Se eles haviam ouvido Dimitri dizendo expressamente que não queria me ver, minha presença devia realmente ser um choque. Mas, até onde eles sabia, alguém com poder me deixou ir até lá, então eles não fizeram perguntas.

Mikhail nos acompanhou na decida, e eu senti meu coração e respiração ficando acelerados. Dimitri. Eu estava prestes a ver Dimitri. O que ia dizer? O que ia fazer? Era quase demais para compreender. Eu precisava me estapear mentalmente para manter o foco, ou eu ficaria em um choque espantado.

Quando chegamos ao corredor que dava nas celas, eu vi dois guardiões diante da de Dimitri, um no final do corredor e mais dois na entrada pela qual viemos. Eu não queria a audiência que Lissa tivera mas, com a ênfase em segurança aqui, eu podia não ter escolha.

“Posso ter um pouquinho de privacidade?” perguntei.

Um dos escoltadores sacudiu a cabeça. “Ordens oficiais. Dois guardiões devem estar a postos na cela o tempo todo.”

“Ela é uma guardiã,” lembrou Mikhail simplesmente. “Eu também. Deixe-nos ir. O resto pode esperar na porta.”

Eu olhei grata para Mikhail. Eu podia aguentar ele por perto. Os outros, decidindo que éramos seguros o bastante, foram discretamente para o final do corredor. Não era privacidade total e completa, mas eles não escutariam tudo.

Meu coração parecia prestes a explodir para fora do peito enquanto eu entrava na cela e o via lá. Ele estava sentado quase da mesma maneira que quando Lissa chegou: na cama, enrolado em si mesma, de costas para nós.

As palavras ficaram presas na minha garganta. O pensamento coerente deixou minha mente. Era como se tivesse esquecido por completo minha razão de estar aqui. 25 mai ?Rafaela?

“Dimitri,” eu disse. Ao menos, foi o que tentei dizer. Eu engasguei um pouco, então os sons que saíram de minha boca eram embaralhados. Mas parecia ser o bastante, porque as costas dele ficaram rígias de repente. Ele não se virou.

“Dimitri,” eu repeti, com mais clareza dessa vez. “Sou... eu.”

Não havia por que dizer mais nada. Ele sabia que eu era desde a minha primeira tentativa de chamá-lo. Eu tinha a sensação de que ele poderia reconhecer a minha voz em qualquer situação. Era provável que ele soubesse o som das batidas do meu coração e da minha respiração. Mas do jeito que estava, eu achava que tinha parado de respirar enquanto esperava pela sua resposta. Quando veio, foi um pouco desapontadora.

“Não.”

“Não o quê?” eu perguntei. “Como em não, não sou eu?”

Ele exalou de frustração, um som quase – mas não exatamente – como aquele que costumava fazer quando eu fazia algo particularmente ridículo em nossos treinos. “Não, como em eu não quero ver você.” A voz dele estava embargada com a emoção. “Eles não deviam deixá-la entrar.”

“É. Bem, eu meio que dei um jeito.”

Ainda assim, ele não iria se virar para mim, o que era agoniante. Eu olhei para Mikhail, que me deu um aceno encorajador com a cabeça. Eu suponho que devia estar feliz por Dimitri ao menos responder.

“Eu precisava ver você. Eu tinha que saber se estava tudo bem.

“Tenho certeza de que Lissa já atualizou você.”

“Eu precisava ver com meus próprios olhos.”

“Bem, agora você vê.”

“Só vejo suas costas.”

Era enlouquecedor mas, mesmo assim, cada palavra que eu tirava dele era uma dádiva. Parecia fazer milhares de anos desde que ouvi sua voz. Como antes, me perguntei como podia ter confundido o Dimitri da Sibéria com este. Sua voz era idêntica em ambos os lugares, no mesmo tom e sotaque, mas, como Strigoi, suas palavras sempre deixavam uma frieza no ar. Essa era quente. Mel e veludo e todo o tipo de coisa maravilhosa me envolvendo, não importa quão terríveis fossem as coisas que ele dizia. 25 mai ?Rafaela?

“Eu não quero você aqui,” disse Dimitri de modo direto. “Não quero ver você.”

Eu esperei um momento para bolar uma estratégia. Dimitri ainda tinha aquele ar deprimido e sem esperanças em seu redor. Lissa se aproximou com gentileza e compaixão. Ela atravessou as defesas dele, mas boa parte disso era porque ele a considerava sua salvadora. Eu podia tentar uma tática similar. Podia ser gentil e compreensível e cheia de amor – e tudo seria verdade. Eu o amava. Eu queria ajudá-lo tanto. Mesmo assim, não sabia qual método em particular funcionaria comigo. Rose Hathaway não foi sempre conhecida pela aproximação gentil. Ainda assim, eu joguei com seu senso de obrigação.

“Você não pode me ignorar,” eu disse, tentando manter minha voz fora do alcance dos outros guardiões. “Você me deve isso. Eu salvei você.”

Alguns momentos de silêncio se passaram. “Lissa me salvou,” ele disse cuidadosamente.

A raiva queimou meu peito da mesma forma que foi quando Lissa o visitou. Como ele podia ter tanta consideração por ela e não por mim?

“Como acha que ela chegou a isso?” eu exigi. “Como acha que ela aprendeu como salvar você? Você tem ideia do que nós – do que eu – passei para conseguir essa informação? Acha que eu ir para a

Sibéria foi loucura? Acredite, você não chegou nem perto de ver a loucura. Você me conhece. Sabe do que sou capaz. E eu quebrei meus recordes desta vez. Você. Me. Deve. Uma.”

Era duro, mas eu precisava de uma reação dele. Algum tipo de emoção. E eu consegui. Ele se virou rapidamente, olhos brilhando e poder emanando de seu corpo. Como sempre, seus movimentos eram tanto ferozes quando graciosos. Da mesma forma, sua voz eram um misto de emoções: raiva, frustração e preocupação.

“O melhor que posso fazer é-”

Ele congelou. Os olhos castanhos que estavam apertados com irritação se arregalaram subitamente com... o quê? Espanto? Temor? Ou talvez o mesmo sentimento atordoado que tive quando vi ele? 25 mai ?Rafaela?

Porque, de repente, tive certeza de que ele estava experimentando o mesmo que senti antes. Ele me viu diversas vezes na sibéria. Ele me viu noite passada no depósito. Mas agora... agora, ele me via com os próprios olhos. Agora que não era mais um Strigoi, o mundo inteiro estava diferente. Sua visão e sentimentos eram diferentes. Mesmo sua alma era diferente.

Era como um daqueles momentos onde as pessoas falam de suas vidas passando diante dos olhos. Porque, enquanto olhávamos um para o outro, cada parte de nosso relacionamento foi vista novamente dentro da minha cabeça. Eu lembrei de quão forte e invencível ele foi quando nos conhecemos, quando ele veio trazer Lissa e eu de volta para os braços da sociedade Moroi. Lembrei da gentileza de seu toque quando ele enfaixou minhas mãos sangrentas e machucadas. Lembrei dele me carregando nos braços depois que Natalie, a filha de Victor, me atacou. Mais que tudo, eu lembrei de nossa primeira noite juntos na cabine, logo antes de um Strigoi tirá-lo de mim. Um ano. Só nos conhecemos durante um ano, mas passamos por uma vida toda dentro dele.

E eu soube que ele também percebeu isso enquanto me estudava. Seu olhar era todo-poderoso, observando cada um de meus atributos. Tentei conseguir uma lembrança opaca de como me parecia hoje. Eu ainda estava usando o vestido do encontro secreto, e sabia que ele ficava bem em mim. Meus olhos deviam estar vermelhos por ter chorado antes, e eu só tive tempo para passar

uma escova rápida nos cabelos antes de sair com Adrian. 25 mai ?Rafaela?

De algum jeito, eu duvidava que qualquer uma dessas coisas importasse. O jeito que Dimitri me olhava... confirmou tudo o que eu já suspeitava. Os sentimentos que ele tinha por mim antes de ser transformado – os sentimentos que foram distorcidos enquanto ele era Strigoi – ainda estava ali. Eles tinham que estar. Talvez Lissa fosse sua salvadora. Talvez o resto da Corte a visse como uma deusa. Eu sabia, naquele momento, que não importava o quão esfarrapada eu me parecesse ou quão vazia ele tentasse manter sua expressão, eu era uma deusa para ele.

Ele engoliu e tentou retomar o controle com esforço, como sempre. Algumas coisas nunca mudavam. “Então o melhor que posso fazer,” ele continuou calmamente, “é me manter longe de você. É o melhor jeito de pagar essa dívida.”

Era difícil para mim manter o controle e ter uma conversa lógica. Eu estava tão espantada quanto ele. Estava ultrajada. “Você se ofereceu para reparar Lissa ficando ao lado dela para sempre!”

“Eu não fiz as coisas...” ele desviou os olhos por um momento, lutando novamente por controle, e então me olhou de novo. “Eu não fiz a ela as coisas que fiz a você.”

“Não era você! Eu não ligo.” Meu temperamento estava queimando de novo.

“Quantos?” ele exclamou. “Quantos guardiões morreram na noite passada por causa do que eu fiz?”

“E... eu acho que seis ou sete.” Perdas duras. Senti uma pequena dor em meu peito, relembrando os nomes lidos naquele porão.

“Seis ou sete.” Dimitri repetiu, angústia na voz. “Mortos em uma noite. Por minha culpa.”

“Você não agiu sozinho! E eu já disse, não era você. Você não podia se controlar. Não importa para mim-” 25 mai ?Rafaela?

“Importa para mim!” ele gritou, sua voz ecoando pelo corredor. Os guardiões em cada ponta se mexeram, mas não chegaram mais perto. Quando Dimitri falou de novo, ele manteve a voz mais baixa, mas ainda estava tremendo por causa das emoções selvagens.

“Importa para mim. É isso que você não entende. Não pode entender como é saber o que eu fiz. Tudo isso de ser um Strigoi... é como um sonho agora, mas um do qual lembro claramente. Não existe perdão para mim. E o que aconteceu com você? Eu lembro mais que tudo. Tudo o que fiz. Tudo o que queria fazer.”

“Você não vai fazer agora,” eu implorei. “Então deixe para trás. Antes – antes de tudo acontecer, você disse que podíamos ficar juntos. Que teríamos tarefas próximos um do outro e-”

“Roza,” ele interrompeu, o apelido atravessando meu coração. Eu acho que ele deixou escapar, não querendo me chamar assim de verdade. Havia um sorriso distorcido no seu lábio, sem humor algum. “Você realmente acha que eles vão permitir que eu seja um guardião novamente? Será um milagre se me deixarem viver!”

“Não é verdade. Assim que perceberem que você mudou e é você mesmo de novo... tudo vai voltar a ser como era antes.”

Ele sacudiu a cabeça com tristeza. “Seu otimismo... sua crença de que pode fazer qualquer coisa acontecer. Ah, Rose. É uma das coisas incríveis em você. Também uma das mais enfurecedoras.”

“Eu acreditava que podia fazê-lo deixar de ser um Strigoi,” eu apontei. “Talvez minha crença no impossível não seja tão louca afinal de contas.”

A conversa era tão grave, tão estraçalhadora, e ainda assim, ainda me fazia lembrar das nossas velhas aulas. Ele tentava me convencer de algo sério, e eu rebatia com lógica de Rose. Costumava me conseguir um misto de descrença e exasperação. Eu tinha a sensação de que, se a situação fosse um pouco diferente, ele teria a mesma atitude agora. Mas essa não era uma aula. Ele não ia sorrir e revirar os olhos. Isso era sério. Era vida e morte. 25 mai ?Rafaela?

“Estou grato pelo que fez, “ ele disse de um modo formal, ainda lutando para vencer seus sentimentos. Era outro traço que compartilhávamos, o desejo de sempre manter o controle. Ele sempre foi melhor que eu.

“De fato, eu lhe devo uma. E é uma dívida que não posso pagar. Como eu disse, o melhor que posso fazer é ficar fora da sua vida.”

“Se você for parte da vida de Lissa, então não poderá me evitar.”

“As pessoas podem conviver umas com as outras sem... sem ser nada além disso,” ele disse firmemente. Era uma coisa tão Dimitri de se dizer. A lógica lutando contra emoção.

E foi naquele momento que perdi a compostura. Como eu disse, ele sempre foi melhor em manter controle. Eu? Nem tanto.

Eu me joguei contra as barras, tão rapidamente que até Mikhail recuou. “Mas eu amo você!” eu assoviei. “E eu sei que você me ama também. Você realmente acha que pode passar o resto da vida ignorando isso quando estiver perto de mim?”

A parte problemática era que por um longo tempo na Academia, Dimitri esteve convencido que ele poderia fazer exatamente isso. E ele estava preparado para passar o resto da vida evitando o que sentia por mim.

“Você me ama,” eu repeti. “Eu sei que ama.” Eu estiquei meu braço através das barras. Estava longe de tocar ele, mas meus dedos tentaram tocar desesperadamente, como se eles pudessem crescer e fazer contato. Isso era tudo que eu precisava. Um toque dele para saber que ele ainda se importava, um toque para sentir o calor da pele dele e –

“Não é verdade,” disse Dimitri silenciosamente, “que você está envolvida com Adrian Ivashkov?”

Meu braço caiu.

“O – onde você ouviu isso?”

“As coisas se espalham,” ele disse, ecoando Mikhail.

“Elas certamente se espalham,” eu murmurei.

“Então você está?” ele perguntou teimosamente.

Eu hesitei antes de responder. Se eu contasse a verdade, ele teria mais motivos para ter razão sobre nós ficarmos separados. Mas era impossível pra mim mentir pra ele.

Sim, mas – “

“Bom.” Eu não tenho certeza de como eu esperava ele reagir. Com ciúmes? Choque? Ao invés disso, enquanto ele se inclinava contra a parede, ele parecia... aliviado. “Adrian é uma pessoa melhor do que pensam. Ele será bom pra você.”

“Mas – “

“É ai que está seu futuro, Rose.” Um pouco daquela atitude inútil e cansada estava retornando. “Você não entende passar pelo que eu passei – voltar de ser um Strigoi. Isso mudou tudo. Não é apesar o que eu fiz com você ser imperdoável. Todos os meus sentimentos... minhas emoções por você... elas mudaram. Eu não me sinto da forma como costumava. Eu posso ser um dhampir de novo, mas depois do que eu passei... bem, isso me assusta. Já está na minha alma. Eu não posso amar ninguém agora. Eu não posso – eu não amo – você. Não tem mais nada entre você e eu.”

Meu sangue ficou frio. Eu me recusei a acreditar nas palavras dele, não com a forma que ele me olhou mais cedo. “Não! Isso não é verdade! Eu te amo e você – “

“Guardas!” Dimitri gritou, sua voz tão alta que era de se admirar que todo o prédio não ouvisse. “Tirem ela daqui. Tirem ela daqui!”

Com um incrível reflexo de guardiões, os guardas desceram para a cela em um segundo. Como um prisioneiro, Dimitri não estava em posição de fazer pedidos, mas as autoridades aqui certamente não iam encorajar uma situação que ia criar uma confusão. Eles começaram a retirar Mikhail e eu, mas eu resisti.

“Não, espere – “

“Não lute,” murmurou Mikhail no meu ouvido. “Nosso tempo acabou, e você não poderia ter conseguido nada mais hoje, de qualquer forma.”

Eu queria protestar, mas as palavras ficaram presas em meus lábios. Eu deixei os guardiões me levarem pra fora, mas não antes deu olhar uma ultima vez Dimitri. Ele tinha um olhar totalmente vazio no rosto, como de um guardião, mas o jeito penetrante com

que ele me olhava, me deu certeza que haviam muitas coisas acontecendo dentro dele. 25 mai ?Rafaela?

O amigo de Mikhail ainda estava em serviço lá em cima, o que nos deixou sair sem nos meter em – muitos – problemas.Assim que saímos ao ar livre, eu parei e chutei um dos degraus com raiva.

“Merda!” eu grite. Alguns Moroi cruzando o jardim – provavelmente vindo de uma festa idiota – me encaram.

“Acalme-se,” disse Mikhail. “Essa foi a primeira vez que você o viu desde que ele mudou. Só existe um certo número de milagres que você pode esperar, assim tão cedo. Ele vai mudar de ideia.”

“Não tenho tanta certeza,” eu disse. Suspirando, eu olhei para o céu. Algumas poucas nuvens se moviam preguiçosamente, mas eu mal as vi. “Você não o conhece como eu.”

Porque embora parte de mim pensasse que muitas coisas que Dimitri tinha dito eram, de fato, uma reação ao choque de voltar a si, havia outra parte de mim que se perguntava. Eu conhecia Dimitri. Eu conhecia seu senso de honra, e suas crenças sobre o que é certo e errado. Ele seguia essas crenças. Ele vivia sua vida por elas. Se ele realmente, realmente acreditasse que a coisa certa a fazer era me evitar e deixar a relação entre nós acabar, bem... havia uma boa chance dele agir conforme sua ideia, não importando o amor entre nós. Como me lembrei mais cedo, ele certamente mostrou muita resistência quando estavamos em St. Vladimir.

Quanto ao resto... a parte sobre ele não me amar mais ou ser capaz de amar qualquer um... bem, esse seria um problema totalmente diferente se fosse verdade. Tanto Christian e Adrian se preocupavam de que houvesse uma parte de Strigoi sobrando nele, mas seus medos eram relacionados a violência e derramamento de sangue. Ninguém teria adivinhado isso: que viver como um Strigoi tinha endurecido seu coração, matando qualquer chance dele amar alguém.

Matando qualquer chance dele me amar.

E eu tinha certeza de que, se esse fosse o caso, então parte de mim morreria também. 25 mai ?Rafaela?

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