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sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Convite da TV aberta e VMB 2010



Mais ou menos na época do vídeo “Fiukar”, recebi pelo Twitter uma
notícia realmente incrível. Diversas pessoas estavam me mandando mensagens
com o aviso de que eu tinha sido indicado para o VMB, Video Music Brasil, uma
das maiores premiações do cenário brasileiro, realizada pela MTV.
Recebi a notícia sorrindo de orelha a orelha. Eu sempre fui fã do VMB e das
apresentações lendárias do Marcos Mion. Era um prêmio que tinha feito parte da
minha infância e adolescência e, quatro meses após o surgimento do Não Faz
Sentido, eu estava na lista dos indicados, na categoria Webstar (criada naquele
ano). Contudo, vencer o prêmio seria um desafio, pois concorria com Joe Penna
(MysteryGuitarMan), PC Siqueira, O Criador (uma das contas de Twitter mais
famosas da época) e Katylene (um blog de humor). Sabia que os concorrentes
mais fortes seriam Joe e PC, por seu público gigantesco, ainda mais Joe, que, ao
falar inglês em seus vídeos, podia ser visto por outros países. Por outro lado, eu e
PC focávamos apenas no público brasileiro e português (e de São Tomé e
Príncipe, embora eu nunca tenha recebido um comentário de alguém de lá).
O nervosismo aumentava à medida que o dia da premiação se aproximava.
Para ser sincero, nunca fui muito bom em ganhar prêmios. Quando tentava, na
maioria das vezes, ficava em segundo lugar, fosse nas Olimpíadas de colégio ou
no prêmio iBest (fiquei em segundo com o site da IsFree.TV). O lugar de vice
sempre esteve presente em minha vida (e olha que eu sou torcedor do Botafogo e
não do Vasco). Por isso, sonhava quase toda noite com a perda do VMB, que,
confesso, tinha grande importância para o meu monstrinho da vaidade.
Antes da data do prêmio, contudo, veio uma notícia inesperada. Um grande
executivo da Rede Record havia procurado minha empresária e ambos marcaram
uma reunião comigo para tratar de um assunto referente à minha ida para a
emissora.
Fiquei absolutamente perplexo com a notícia. Ir para a TV aberta era um sonho
antigo de infância, mas não imaginava que isso aconteceria tão rapidamente.
Além do mais, já havia assinado contrato com o Multishow e buscávamos a
solução de um programa ideal para gravarmos.
Fui para São Paulo sem saber o que esperar. Seria muito estranho se a Record
me oferecesse um programa em sua grade. Aliás, não só estranho como maluco.
Seria uma aposta fora da normalidade para o conservadorismo da TV aberta.
Encontrei-me com a Adriana ainda no aeroporto e fomos conversando no carro
até a sede da Rede Record.
– Você faz ideia do que vão oferecer, Dri?
– Nem ideia, mas vamos falar com um cara que é conhecido por ser bastante
incisivo na hora de negociar, então, faça presença mas deixa que eu falo com ele.
– A Adriana me protegendo já tinha se tornado um fato comum em minha vida.
– Você acha que ele vai me oferecer um programa?
– Não, mas, se for isso, vamos ter que conversar muito. Não acho que você
esteja pronto pra TV aberta. É lá que muita gente se queima, por causa dos limites
e do jeito que a TV é. Vamos ver o que ele tem pra oferecer e aí conversamos.
Concordei inteiramente. Imagine um Não Faz Sentido na TV aberta: “Eu não
gosto de Crepúsculo, caramba, é muito artificial, carambolas, o Edward é gay” –
demitido por homofobia.
Chegamos à sala de reunião do tal executivo e já no aperto de mãos percebi
que ele era o oposto de Flávio Augusto e totalmente condizente com o perfil de
executivo que eu tanto desprezo. Olhar de cima pra baixo, posição de arrogância
e certeza de que entende muito mais de qualquer assunto que você.
O executivo sentou-se em sua bela mesa (mentira, ele sentou na cadeira) e eu e
Adriana nos posicionamos de frente para ele, em duas poltronas.
– Felipe, eu quero te oferecer um cargo dentro da Rede Record – disse o
cidadão.
A simples forma de ele pronunciar essas palavras já me causava repulsa. Era
como se ele estivesse me oferecendo uma cadeira ao lado de Jesus Cristo no reino
dos céus.
– Então, fulanodetal – Adriana começou a falar e eu não lembro o nome do
sujeito –, a gente primeiro gostaria de saber do que se trata.
Quando Adriana começou a falar, percebi que o executivo já tinha ficado
contrariado. Imagino que em sua imaginação fértil ele deva ter presumido que eu
sairia dançando pela sala com a oportunidade recebida. Pobre menino da internet,
vou mudar sua vida com uma oportunidade na televisão.
Ele começou a falar sobre o que se tratava:
– A gente está reformulando o programa da Ana Hickmann e queremos deixálo
mais engraçado, com mais reportagens de rua. A gente quer que o Felipe seja
esse cara, o repórter de rua do programa, do jeito dele, engraçadão, entrevistando
as pessoas.
Tive de olhar para o chão para controlar o impulso desesperado de soltar uma
risada. Veja bem, não quero dizer que a função oferecida era uma piada, mas
imaginei meu público reagindo à notícia “Felipe Neto vira o repórter de rua do
programa da Ana Hickmann”.
A oferta não tinha o menor cabimento e, ainda por cima, não condizia com o
meu perfil. Sem contar o fato de que o público da internet reagiria de forma
absolutamente agressiva em relação a isso. De garoto questionador e ácido para
repórter de rua tentando fazer comédia no programa da Ana Hickmann da Rede
Record.
A Adriana nem precisou conversar comigo para saber que eu não iria aceitar
aquela oferta. Sem ao menos ouvir qual seria meu salário, ela começou a recusar
a oferta da forma mais educada que eu já ouvi alguém fazer.
Foi nesse momento que uma das cenas mais hilárias de toda a minha vida
aconteceu.
Acredito que o executivo não imaginava, nem em seus sonhos mais
pessimistas, que um reles garoto que produzia vídeos na internet seria capaz de
recusar uma chance em seu imenso canal de televisão. Enquanto Adriana falava,
ele reagia como se estivesse recebendo socos no estômago e, quando ela acabou,
era possível sentir a fúria em seus olhos. Ele se direcionou a mim:
– Olha só, eu estou te oferecendo uma puta oportunidade, você vai ter uma
audiência gigantesca, algo que você nunca vai conseguir ter fora daqui.
Eu precisava me conter para não rir. O executivo nitidamente não entendia
rigorosamente nada de internet, muito menos devia imaginar que o Não Faz
Sentido já ultrapassava a barreira das 42 milhões de visualizações em apenas
cinco meses. Fiquei calado, sem saber como reagir àquilo.
Foi aí que ele socou a mesa.
Pode parecer mentira, mas uma cena de filme série B de Hollywood se
materializou na minha frente. Ele disse:
– Um dia você vai olhar pra trás e pensar: aquela chance era minha, aquela
merda era minha. – E socou a mesa duas vezes ao falar isso.
Bem... Se você for o executivo que socou a mesa tentando me fazer assinar um
contrato por medo, saiba que já se passaram quase três anos desde seu ataque de
chilique e não teve sequer uma vez em que eu tenha pensado “aquela chance era
minha”. Sinto muito.
Enquanto caminhava para o carro de Adriana, andando pelo estacionamento,
só conseguia pensar quando um dia teria a chance de relatar essa história para as
pessoas. Afinal, se teve uma coisa produtiva naquela viagem foi justamente uma
história maravilhosa de se contar. O dia em que um altíssimo executivo da TV
aberta socou a mesa me olhando com raiva após ver que eu não queria trabalhar
pra ele.
Contudo, foi só quando cheguei em casa, já no Rio de Janeiro, que parei para
pensar até que ponto a decisão de ligar a câmera e começar a falar besteira tinha
me levado. Críticas, elogios, fofocas na imprensa, indicação para o VMB,
contrato de garoto-propaganda da Wise Up, motivo de apreensão no gabinete da
Dilma, convite para a TV aberta e executivo da Record socando a mesa. Tudo
isso em cinco meses.
No final das contas, a Record acabou promovendo um concurso de stand-up
para selecionar o novo repórter da Ana Hickmann e, por ironia do destino, meu
amigo Victor Sarro acabou sendo o ganhador. Sua vida de fato mudou
inteiramente depois disso, o que me deixa ainda mais contente por ter recusado.
Pois gerou a chance de que o trabalho de um humorista maravilhoso fosse
reconhecido.
Poucos dias depois, a história não parecia mais engraçada. Aliás, nada mais
parecia engraçado, pois faltava apenas uma semana para o resultado do VMB.
Como eu já tinha pedido votos em um vídeo, não quis fazer mais nada, para não
parecer que minha vida inteira girava em torno daquilo e também por não querer
fazer com meu público o que tanto tinha condenado outros artistas a fazerem.
Apenas dei algumas tuitadas avisando sobre a premiação e alertando para que
votassem naquele que eles consideravam mais justo que ganhasse. O mesmo era
feito pelos outros concorrentes ao troféu.
Faltando poucos dias para o prêmio, a imprensa noticiou que eu tinha assinado
com o Multishow e, logo em seguida, que o PC tinha assinado com a MTV. Foi
aí que eu vi o sonho de ganhar o VMB ir por água abaixo.
É conhecido no mundo da TV que Multishow e MTV se tratam como
concorrentes até a morte. Logo, as minhas chances de ganhar um prêmio
promovido pela MTV eram ridículas agora que a imprensa havia noticiado minha
ida para o Multishow, ainda mais sabendo que o PC havia assinado justamente
com o canal provedor do prêmio. Isso sem esquecer que ainda tinha Joe Penna,
Katylene e O Criador na disputa.
Finalmente chegou o dia tão esperado. Peguei o avião para São Paulo sentindo
que aquela seria uma noite inesquecível, fosse qual fosse o resultado. Àquela
altura, todos diziam que o prêmio seria disputadíssimo entre mim e PC, baseandose
em estimativas dos comentários no ato da votação (as pessoas podiam
comentar logo abaixo de onde votavam). Joe Penna acabou ficando pra trás
justamente por seu público ser gigantesco no exterior, mas nem tanto no Brasil.
Quis ficar sozinho, pois sabia que os momentos que antecediam a premiação
seriam de reflexão e que eu não gostaria de compartilhar disso. Afinal, isso
significaria ter de ficar ouvindo o tempo inteiro as perguntas: “Está nervoso? O
que você vai falar no discurso se ganhar?”
Aproveitei minha solidão no hotel para tentar pensar no que falaria em meu
discurso caso ganhasse. Já havia praticado no chuveiro, segurando o xampu
como se fosse o troféu, mas não passava de uma brincadeira. Contudo, por mais
que tentasse pensar no que falaria, nenhuma ideia boa vinha à cabeça. Não
conseguia parar de pensar que, mesmo se ganhasse na votação, havia a
gigantesca chance de a MTV manipular o resultado para dar o prêmio para
alguém da casa, em vez de alguém da principal concorrente.
Acabei quebrando minha solidão com uma conversa agradável que tive com
Pablo Peixoto, que concorria na categoria Webhit com seu vídeo “Dunga em Um
Dia de Fúria”, e estava hospedado no mesmo hotel. Antes de seguirmos para a
premiação ainda tive a oportunidade de conhecer o pessoal do Galo Frito, que
fazia paródias musicais no YouTube e concorria na mesma categoria de Pablo
com o vídeo “Justin Biba”, satirizando o clipe de Justin Bieber, numa produção
louvável que contava com a presença de Helio De La Peña.
Encontrei também com Andressa Bianco momentos antes de entrar na van que
nos levaria para o evento. Ela era a pessoa da DNA responsável em me
acompanhar e estar ao meu lado no momento da premiação. Entramos todos na
mesma van e partimos rumo ao Credicard Hall.
Quando saímos da van, uma loucura estava formada em frente às portas do
evento. Centenas de fãs das diversas bandas e artistas indicados estavam
esperando as pessoas que entrariam pelo tapete vermelho. Foi uma confusão de
gente vindo atrás de nós e pedindo fotos, enquanto Andressa tentava de todas as
formas me proteger e me tirar dos grupos muito grandes que me cercavam.
Encontrei com o PC Siqueira ainda do lado de fora. Ele estava junto de seu
primo e irmão, Diego Quinteiro e Beto Siqueira, gravando um vídeo que iria para
o ar no dia seguinte como “A Noite do VMB”. Era visível que o prêmio era tão
importante pra mim quanto pra ele.
Tiramos algumas fotos e finalmente entramos pelo tapete vermelho, ao som de
aplausos e gritos. Aproveitamos o momento para publicar uma foto no Twitter
fingindo que estávamos prestes a sair no soco (era divertido ver a raiva que os fãs
de um fomentavam pelos fãs do outro) e seguimos para a plateia da premiação, no
gigantesco Credicard Hall e mais de 5 mil pessoas que assistiriam à apresentação
de Marcelo Adnet que comandava o evento.
Andressa sentou-se ao meu lado, enquanto PC ficou na cadeira em frente.
Conversei nervosamente com ela sobre alguma coisa da qual não faço a menor
ideia (talvez tenha sido sobre a caça aos polvos no sul da Ásia, não sei) e
esperamos pelo momento decisivo.
Devo confessar que lembro muito pouco do que aconteceu naquela noite,
enquanto esperava nervosamente sentado, a perna batendo pra cima e pra baixo.
Tenho vagas lembranças do Adnet fazendo algumas piadas, imitando o Joel
Santana e sua pronúncia ao tentar falar inglês, mas pouca coisa além disso.
Lembro da banda Restart vencendo algum prêmio e recebendo uma chuva de
vaias na hora de buscar o troféu. As luzes eram fortes e, na minha frente, era
possível ver que PC também pouco falava. Nós dois sabíamos da importância que
o prêmio teria para nossas vidas, uma vez que ambos tínhamos praticamente a
mesma idade e havíamos crescido tendo o VMB como referência de
reconhecimento no cenário nacional.
Restart venceu outro prêmio, como já era previsto, uma vez que os votos eram
populares e nenhuma outra banda se destacava mais em paixão dos fãs do que os
meninos coloridos. Porém, mais uma vez, uma chuva de vaias veio junto com o
troféu. Um deles puxou o microfone e agradeceu imensamente à “Família
Restart” (na mesma hora novas vaias surgiram, enquanto algumas fãs
enlouquecidas tentavam superar o barulho com gritos e aplausos).
Logo em seguida, foi a vez do prêmio Webhit, anunciando que o próximo
seria justamente o Webstar. A diferença entre os dois prêmios era que o primeiro
consagrava um único vídeo isolado de muito sucesso, enquanto o segundo
destacava o dono do canal de maior sucesso pelo conjunto da obra de todos os
vídeos publicados. Galo Frito venceu na categoria, conforme todos já haviam
previsto, devido ao sucesso inacreditável do vídeo “Justin Biba”. Todos subiram
no palco fazendo uma grande festa, inclusive Helio De La Peña. Mas eu não
conseguia ouvir mais nada, apenas olhava para Andressa ao meu lado, que
partilhava do mesmo nervosismo que eu. Instantes depois, o que para mim
pareceu meia hora, entrou no palco Christian Chávez, grande astro mexicano que
fez história com a audiência brasileira. Ele seria o responsável por entregar o
troféu de Webstar.
É impressionante como um momento de tamanha importância em minha vida
possa ter ficado tão mal impresso em minha memória. Lembro das luzes
vibrando, como se tudo estivesse em câmera lenta. O PC, na minha frente,
demonstrava um nervosismo do mesmo nível que o meu, segurando sua câmera
ligada e falando alguma coisa para o registro do momento. Christian Chávez
falava alguma coisa, mas eu não conseguia escutar.
Os nomes dos concorrentes começaram a aparecer na tela, junto de trechos de
seus trabalhos.
– PC, se eu ganhar, quero que você suba no palco comigo – disse a ele.
– Se eu ganhar, também quero que você vá. Se um de nós dois ganhar, a gente
leva a câmera e filma o momento, beleza?
Concordei na mesma hora. Não fizemos isso pensando em mandar uma
mensagem para ninguém, apenas sabíamos que nós dois tínhamos sido
responsáveis por tudo aquilo que estava acontecendo. Pelos milhões de vlogs que
surgiam a cada dia no Brasil, pelo reconhecimento da mídia para essa nova forma
de entretenimento, pela criação de uma categoria específica em um dos maiores
prêmios do entretenimento nacional. Se apenas um dos dois tivesse surgido,
dificilmente teríamos sido capazes de gerar tamanho resultado. Era nisto que
pensávamos: no quanto um tinha sido importante para a vida do outro.
Christian Chávez começou a abrir o envelope. Andressa segurou minha mão
com toda a força que seus pequenos dedos eram capazes. À minha frente, PC
praticamente prendeu a respiração. Não me importava qual dos dois ganhasse
mais, eu sabia que, diferentemente de outras categorias naquele ano, aquela era
uma que premiaria por merecimento, pois todos os envolvidos tinham sido
inovadores, criativos e haviam fomentado um novo modelo de mídia de forma
arrasadora. Eu, PC, Joe Penna, O Criador e Katylene, todos mereciam aquele
troféu. Não importava mais o fato de que eu tinha sido contratado pela Multishow
e o PC, pela MTV; se ele ganhasse seria tão merecido quanto qualquer outro
entre os indicados. Senti grande parte da minha vaidade e egocentrismo se esvair
enquanto Andressa tentava de todas as formas quebrar minha mão.
O barulho do público era ensurdecedor.
Christian pediu calma.
– Vencedor é...
Fechei os olhos.
– Felipe Netooooo!
Uma explosão de gritos somou-se ao resultado. Levantei dando pulos no ar e
abraçando Andressa ao mesmo tempo em que berrávamos juntos a plenos
pulmões. As luzes piscaram mais do que nunca e ainda pude ouvir, abaixo de
mim, Diego Quinteiro zoando seu primo PC Siqueira, com a frase que ficou
registrada para sempre no vídeo que foi ao ar no dia seguinte: “Hahaha, se
fudeu!” Primos são sempre babacas uns com os outros, impressionante.
Abracei PC e descemos juntos as escadas, não nos importando se aquilo
pudesse ser visto como uma quebra de regulamento por parte da MTV. Eu queria
que ele estivesse ao meu lado, como símbolo de tudo que representava para
aquilo que tanto havíamos incentivado na internet brasileira.
Ao mesmo tempo em que tentava correr entre as pessoas que gritavam
enlouquecidas abaixo da plataforma montada para os vencedores, não conseguia
realmente conceber que tinha acabado de ganhar um VMB. Bati nas mãos das
pessoas, comemorando de forma até mesmo exagerada. Nenhuma vaia surgiu no
meio da explosão de gritos e aplausos, apenas o incentivo de um público que eu
não fazia ideia se era composto por adultos ou adolescentes, pois apenas podia
sentir o toque de suas mãos nas minhas.
Nenhum discurso estava preparado. Nenhuma palavra vinha à minha cabeça
quando recebi o troféu das mãos de Christian e me vi de frente para aquele mar
de gente, com o microfone esperando por um discurso.
– VALEEEEU!
Não tinha a menor necessidade de um berro, visto que o que estava à minha
frente era um microfone, mas não pude conter. Vendo meu entusiasmo, o público
berrou em resposta com ainda mais vigor.
– Quero agradecer muito a todo mundo que votou, todo mundo que participou.
Dizer que eu trouxe aqui o meu amigo PC Siqueira, que também fez parte de
todo esse movimento e também é um ícone de internet. – Todos gritaram
novamente, dando os merecidos parabéns que PC merecia. – Muito obrigado a
todos, a todas as pessoas que estão presentes na minha vida, minha família.
Nesse momento, me lembrei do discurso da banda colorida e todo o
agradecimento artificial e bobo na definição de seus fãs como “Família Restart”.
Não me contive, acabei gritando com todas as forças:
– FAMÍLIA DE VERDADE! – O Credicard Hall foi à loucura, os berros
chegaram a um volume inacreditável. Parei por alguns segundos para registrar
mentalmente aquela imagem inesquecível e continuei: – Pai, mãe, obrigado!
Muito obrigado!
E saí, deixando para trás mais gritos entusiasmados e aplausos inesquecíveis de
um reconhecimento que até hoje carrego com muito orgulho. Depois de um
tempo acabei diminuindo a importância que prêmios causam na vida de qualquer
pessoa. Troféu algum pode ter mais significado que um sincero agradecimento de
um fã ou o orgulho de seus pais por tudo o que você fez e faz, mas o VMB foi
algo especial em minha vida, por tudo que eu tinha passado, por todas as
pedradas, alfinetadas e tentativas de tirar o crédito e derrubar o Não Faz Sentido.
Após tantos conflitos psicológicos, tantas batalhas vencidas na cabeçada, cada
uma deixando uma diferente marca, aquele prêmio lavou minha alma e os berros
que soltei naquela noite levaram consigo muito da energia negativa que ainda
carregava. Pela primeira vez em muito tempo, me senti leve como uma pena.
Fui para os bastidores da premiação, onde uma ala VIP tinha sido montada
para os vencedores. Carreguei PC comigo, pois ele merecia estar ali tanto quanto
eu. Fomos juntos até o estúdio onde Mari Moon gravava entrevista com os
vencedores. Depois fomos juntos para a coletiva de imprensa, onde os fotógrafos
aguardavam para uma chuva de flashes. Dividimos aquele momento com igual
intensidade e fomos para a festinha interagir com outros vencedores.
A noite prosseguiu de uma forma incrível. Fomos para a festa especial da
MTV, onde conheci diversos ícones do humor e entretenimento brasileiro. O Não
Faz Sentido era comentado em diversos cantos, inclusive por todos esses famosos
que eu não fazia ideia de que estavam cientes do meu trabalho. A festa foi
bastante proveitosa, exceto por toda a futilidade inacreditável que se seguiu com a
mulherada presente.
Por não ter como deixar o troféu em lugar algum, tive que ficar com ele nas
mãos o tempo todo. Dançando, bebendo ou conversando. Assim como eu, todos
os outros ganhadores exibiam seus cachorros dourados (símbolo do VMB) para
todo lugar em que iam e, finalmente para meu desgosto, pude ver inúmeras
mulheres lindíssimas se jogando para cima de todos aqueles que carregavam o
dito prêmio.
Digo “finalmente meu desgosto” pois foi nesse momento que minha
personalidade começou a entrar em equilíbrio novamente quanto ao assunto
“sexo”. Assim como faziam com todos os outros vencedores, modelos,
participantes de reality show, atrizes e vários outros tipos de mulher vieram
conversar comigo, pedindo para segurar o troféu, segurando no meu braço
enquanto falavam e algumas delas passando seus telefones em pedaços de papel.
Uma ou outra ia além, puxando meu ouvido e descrevendo obscenidades que
gostariam de ter a chance de fazer quando eu saísse dali.
Nenhuma me interessou. Diferentemente de como eu vinha agindo, voltei a
considerar tudo aquilo uma tremenda babaquice. Nenhuma daquelas mulheres
estava de fato interessada em mim. Se pudessem, transariam com meu troféu. E
eu já tinha passado por noites sem o menor significado, o suficiente para saber
que qualquer uma delas não me traria a menor felicidade. Até porque, acho
importante relatar aqui para você, homem que nesse momento deve estar me
chamando de bicha: quando uma mulher só quer transar contigo pelo que você
representa e não por quem você é, a noite é sempre uma verdadeira bosta, não
importa o quão gostosa a mulher seja. Aliás, quanto mais turbinada a mulher é,
maiores são as chances de ela transar com você mais preocupada em se olhar no
espelho para ver se o cabelo está legal enquanto faz o ato, do que
verdadeiramente se entregar ao momento.
Decidi voltar sozinho para o hotel e, em seguida, fui para uma pós-festa no
quarto do pessoal do Galo Frito. Acabei tendo uma noite de conversa muito mais
agradável que qualquer transa sem sentido que somente serviria para somar uma
história para os amigos íntimos.
Fui dormir mais feliz do que me sentia há meses. Contente pelo resultado da
premiação e mais satisfeito ainda pela minha própria atitude, muito mais
condizente com o cara que sempre fui durante toda a vida, em vez do garoto
deslumbrado e sedento por sexo sem significado dos últimos tempos.

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