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sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Capitulo 24

O homem sorriu. “Você faz parecer uma coisa ruim.”

Eu fiz uma cara e olhei para a sacola tecnológica com novo apreço. “O que está havendo?”

“Eu sou um mensageiro. Faço favores ao sr. Mazur.”

“Esse é um jeito bonito de dizer que você espiona para ele? Acha todos os segredinhos sujos das pessoas para que ele possa usá-los contra as pessoas e continuar jogando seus jogos?” Abe parecia saber tudo sobre todos – especialmente política da realeza. De que outra forma ele poderia ter olhos e ouvidos em qualquer lugar? Digamos, na Corte? Até onde eu sabia, ele podia ter escutas no meu quarto.

“Espionar é uma palavra pesada,” eu percebi que o cara não negou a acusação. “Além disso, ele paga bem. E é um bom chefe.” Ele me deu as costas, o serviço concluído, mas deu um último aviso. “Como eu disse – é sensível ao tempo. Leia o aviso assim que puder.”

Metade de mim queria jogar aquilo no homem. Estava me acostumando à ideia de ser a filha de Abe, mas isso não queria dizer que eu queria me meter num esquema maluco dele. Uma sacola de equipamentos parecia um presságio.

Mesmo assim, eu a levei para minha suíte e esvaziei ela sobre minha cama. Havia algumas folhas de papel, a de cima sendo uma carta digitada.

Rose,

Eu espero que Tad tenha conseguido entregar isso em tempo. Espero que não tenha sido muito má com ele. Faço isso em benefício de alguém que deseja falar com você sobre um assunto urgente. Porém, é uma conversa que ninguém mais pode ouvir. O laptop e o modem via satélite nessa sacola vão permitir uma discussão com privacidade, desde que você esteja em um lugar privado. Seu encontro se dará às sete da manhã.

Não havia nome, mas eu não precisava de um. Soltei a carta e olhei para a confusão de fios. Faltava menos de uma hora para as sete.

“Ah, qual é, velho,” exclamei. 26 mai ?Rafaela?

Para dar algum crédito a Abe, os papeis tinham algumas direções bem básicas, que não necessitavam da visão de um engenheiro da computação. O único problema era, havia muitos deles, detalhando onde cada cabo ia, qual senha para logar, como configurar o modem, e por aí vai. Por um momento, pensei em ignorar tudo aqui. Ainda assim, como alguém como Abe usava a palavra urgente, me fazia pensar que talvez não fosse bom me apressar em rejeitar isso.

Então, me preparando para algumas acrobacias técnicas, eu segui as instruções. Levou quase todo o tempo que eu possuía, mas eu consegui conectar o modem e a câmera e acessar o programa seguro que me permitiria uma vídeo-conferência com o contato misterioso de Abe. Eu terminei com alguns minutos de folga e esperei encarando a tela preta no meio da tela, me perguntando em que tinha me metido.

Exatamente às sete, a janela veio à vida e um rosto familiar – embora inesperado – apareceu.

“Sydney?” eu perguntei surpresa.

O vídeo tinha a mesma imagem levemente tremida que a maioria dos enviados pela Internet tinha, mas, mesmo assim, o rosto da minha (mais ou menos) amiga Sydney Sage sorriu de volta para mim. O sorriso era de um humor seco, mas isso era típico dela.

“Bom dia,” ela disse, bocejando. Pelo estado de seu cabelo loiro, que ia até a altura do queixo, era provável que ela tivesse acabado de acordar. Mesmo na resolução baixa, a tatuagem dourada de lírio em sua bochecha brilhava. Todos os Alchemists tinham a mesma tatuagem. Ela consistia em tinta e sangue de Moroi, dando ao portador a mesma saúde boa e longevidade dos Moroi. Também havia um pouco de compulsão ali, para impedir a sociedade secreta dos Alchemists de revelar qualquer coisa que não deviam sobre os vampiros.

“Noite,” eu disse. “Não manhã.”

“Podemos discutir seus horários bagunçados e profanos outra hora,” ela disse. “Não é para isso que estou aqui?” 26 mai ?Rafaela?

“Por que você está aqui?” eu perguntei, ainda espantada em vê-la. Os Alchemists faziam seus trabalhos quase com relutância, e embora Sydney gostasse de mim mais do que ela gostava da maioria dos Moroi e dhampirs, ela não era o tipo que fazia telefonemas (ou vídeos) amigáveis. “Espere... você não pode estar na Rússia. Não se for de manhã...” Tentei me lembrar diferença de horários. Sim, para os humanos de lá, o sol teria se posto ou estaria no processo de se por neste momento.

“Estou de volta ao meu país de origem,” ela disse com uma grandeza falsa. “Consegui um posto novo em New Orleans.”

“Uau, legal.” Sydney tinha odiado ser mandada para a Rússia, mas a impressão que eu tive era que ela ficaria lá até terminar seu estágio como Alchemist. “Como conseguiu isso?”

Seu sorriso pequeno virou uma expressão de desconforto. “Ah, bem. Abe, hã, meio que me fez um favor. Ele fez isso.”

“Você fez um acordo com ele?” Sydney devia odiar mesmo a Rússia. E a influência de Abe devia ser realmente profunda se ele podia afetar uma organização humana. “O que deu a ele em trroca? Sua alma?” Fazer uma piada como essa para uma pessoa religiosa como ela não era muito apropriado. Mas é claro, eu acho que ela pensava que Moroi e dhampirs comiam almas, então talvez meu comentário não estivesse muito deslocado.

“Eis o problema,” ela disse. “Era um daqueles acordos do tipo 'vou deixá-la saber quando precisar de você no futuro.'”

“Idiota,” eu disse.

“Ei,” ela estourou. “Eu não preciso fazer isso. Na verdade, estou lhe fazendo um favor ao falar com você.”

“Por que você está falando comigo, exatamente?” eu queria perguntar mais sobre o pacto aberto dela com o diabo, mas percebi que isso ia me fazer ser desconectada.

Ela suspirou e tirou um pouco de cabelo da frente do rosto. “Eu preciso perguntar algo para você. E eu juro que não vou denunciá-la... eu só preciso descobrir a verdade para que não percamos nosso tempo com uma coisa.” 26 mai ?Rafaela?

“Ok...” Por favor não me pergunte sobre Victor, eu rezei.

“Você invadiu algum lugar recentemente?”

Droga. Eu mantive uma expressão completamente natural. “O que quer dizer com isso?”

“Os Alchemists tiveram alguns registros roubados recentemente,” ela explicou. Ela estava toda profissionalmente séria agora. “E todos estão indo a loucura tentando descobrir quem foi – e por quê.”

Mentalmente, eu soltei um suspiro de alívio. Ok. Não era sobre Tarasov. Graças a Deus existia um crime do qual eu não fosse a culpada. Então, o significado real daquelas palavras me atingiu. Eu a olhei fixamente para ela.

“Espere. Vocês são roubados e é de mim que você suspeita? Eu achei que estivesse fora da sua lista de criaturas malignas?”

“Nenhum dhampir está fora da minha lista de criaturas malignas,” ela disse. O meio sorriso dela voltou, mas eu não sabia dizer se ela estava brincando ou não. Ele sumiu rapidamente, mostrando que aquilo era muito importante para ela. “E acredite em mim, se qualquer um pudesse invadir nossos registros, você poderia. Não é fácil. Praticamente impossível.”

“Hã, obrigada?” Eu não tinha certeza se devia me sentir lisonjeada ou não.

“É claro,” ela continuou, zombeteira, “só roubaram registros em papel, o que foi idiota. Tudo tem um back-up digital hoje em dia, então não sei por que eles estavam escavando armários jurássicos de arquivos.”

Eu poderia dar a ela milhares de razões pelas quais alguém faria isso, mas descobrir por que eu era a suspeita número um era mais importante. “Isso é idiota. Então, por que acha que fui eu quem roubou?”

“Por causa do que foi roubado. Eram informações sobre um Moroi chamado Eric Dragomir.”

“Eu – quê?”

“É sua amiga, certo? Quero dizer, a filha dele.”

“Sim...” eu estava quase sem fala. Quase. “Você tem arquivos sobre Moroi?” 26 mai ?Rafaela?

“Temos arquivos sobre tudo,” ela disse orgulhosa. “Mas quando tentei pensar em quem poderia cometer esse crime e teria interesse em um Dragomir... bem, seu nome veio à mente.”

“Eu não fiz isso. Eu faço muitas coisas, mas não isso. Nem sabia que vocês tinham esse tipo de registro.”

Sydney me olhou com suspeita.

“É verdade!”

“Como eu disse antes,” ela me contou, “eu não vou denunciar você. Sério. Eu só quero saber para que possa fazer as pessoas pararem de perder tempo com certas pistas.” Sua presunção diminuiu. “E, bom, se foi você... eu preciso vigiar você. Prometi para o Abe.”

“Qualquer coisa para você acreditar em mim. Eu não fiz isso! Mas agora eu quero saber quem fez. O que eles roubaram? Tudo sobre ele?”

Ela mordeu o lábio. Dever um favor a Abe podia significar que ela trairia seu próprio grupo, mas ela parecia ter limites sobre quanto disso ela podia fazer.

“Vamos lá! Se você tem um back-up digital, você tem que saber o que tinha ali. É de Lissa que estamos falando.” Uma ideia surgiu em minha mente. “Pode me mandar cópias?”

“Não,” ela disse rapidamente. “Absolutamente não.”

“Então, por favor... só uma dica sobre o que está lá! Lissa é minha melhor amiga. Não posso deixar nada acontecer a ela.'

Eu me preparei para a rejeição. Sydney não parecia muito pessoal. Ela tinha amigos? Podia entender o que eu sentia?

“A maior parte é biografia,” ela disse por fim. “Algo de sua história e observações que fizemos.”

“Observ-” eu deixei aquilo passar, decidindo que realmente não queria saber mais do que precisava sobre os Alchemists nos espionando. “Mais alguma coisa?”

“Registros financeiros.” Ela fez careta. “Particularmente sobre grandes depósitos que ele fez para uma conta bancária em Las Vegas. Depósitos que ele se esforçou para esconder.”

“Las Vegas? Eu fui lá faz pouco tempo...” Não que isso fosse relevante. 26 mai ?Rafaela?

“Eu sei,” ela disse. “Eu vi algumas fitas de segurança do Witching Hour com suas aventuras. O fato de você sair correndo daquele jeito foi parte do motivo para eu suspeitar de você. Parecia combinar com você.” Ela hesitou. “O cara com você... o Moroi alto com cabelo escuro... é seu namorado?”

“Er, é.”

Levou muito tempo e esforço para ela conceder a próxima declaração. “Ele é bonitinho.”

“Para uma criatura maligna da noite?”

“Claro.” Ela hesitou novamente. “É verdade que vocês foram lá para fugir juntos?”

“O quê? Não! Essas histórias chegam até vocês também?” Eu sacudi minha cabeça, quase rindo de quão ridículo tudo aquilo era, mas sabendo que precisava voltar aos fatos. “Então, Eric tinha uma conta em Vegas para onde estava mandando dinheiro?”

“Não era dele. Era de alguma mulher.”

“Que mulher?”

“Ninguém – bem, ninguém que possamos rastrear. Ela estava como 'Jane Doe.'”

“Original,” eu resmunguei. “Por que ele estaria fazendo isso?”

“Isso, nós não sabemos. Nem nos importamos de verdade. Só queremos saber quem nos invadiu e roubou nossas coisas.”

“A única coisa que sei é que não fui eu.” Vendo o olhar investigativo dela, eu joguei as mãos para cima. “Qual é! Se eu quisesse saber sobre a vida dele, eu perguntaria para Lissa. Ou roubaria nossos próprios registros.”

Vários momentos de silêncio se passaram.

“Ok. Acredito em você,” ela disse.

“Mesmo?”

“Você quer que eu não acredite?”

“Não, é que convencer você foi mais fácil do que eu imaginei.”

Ela suspirou.

“Eu quero saber mais sobre esses registros,” eu disse seria. “Eu quero saber quem é essa Jane Doe. Se pudesse me conseguir outros arquivos-”

“Sydney sacudiu a cabeça. “Não. É aqui que eu corto você. Você já sabe demais. Abe queria que eu a mantivesse longe de encrenca e eu fiz isso. Fiz minha parte.”

“Não acho que Abe vai deixar você escapar tão facilmente. Não se você fez um acordo aberto.” 26 mai ?Rafaela?

Ela não reconheceu isso, mas o olhar de seus olhos castanhos me fez pensar que ela concordava. “Boa noite, Rose. Dia. Tanto faz.”

“Espera, eu-”

A tela ficou preta.

“Droga,” eu grunhi, fechando o laptop com mais força do que devia.

Cada parte daquela conversa foi um choque, começando com Sydney e terminando com alguém roubando registros dos Alchemists sobre o pai de Lissa. Por que alguém se importaria com um morto? E por que roubar registros? Para descobrir alguma coisa? Ou para esconder informação? Se fosse a última, Sydney tinha razão em dizer que foi uma tentativa falha.

Eu revi tudo em minha cabeça enquanto me arrumava para ir para a cama, encarando meu reflexo enquanto escovava os dentes. Por que, por que, por quê? Por que fazer isso? E quem? Eu não precisava de mais intriga na minha vida, mas tudo que envolvia

Lissa precisava ser tratado com seriedade. Infelizmente, logo ficou claro que eu não descobriria nada essa noite, então eu dormi com essas perguntas rodando na minha cabeça.

Eu acordei na manhã seguinte me sentindo um pouco menos sobrecarregada – mas ainda sem respostas. Eu pensei se devia ou não contar a Lissa o que descobri e finalmente decidi que sim. Se alguém estava colhendo informações sobre seu pai, ela tinha o direito de saber, e, além disso, aquilo não era nada comparado aos rumores sobre seu-

Um pensamento me espantou enquanto eu espalhava xampu nos cabelos. Eu estivera muito cansada e surpresa para juntar as peças na noite passada. O cara no Witching Hour disse que o pai de Lissa foi lá muitas vezes. Os registros de Sydney diziam que ele fez grandes depósitos em uma conta em Las Vegas. Coincidência? Talvez. Mas com o passar do tempo, eu estava começando a deixar de acreditar em coincidências.

Assim que fiquei apresentável, eu me dirigi ao lado de Lissa da Corte – mas não cheguei muito longe. Adrian estava me esperando na sala de estar do meu prédio, atirado em uma cadeira.

“É cedo para você, não?” eu provoquei, parando diante dele.

Eu esperava um sorriso, mas Adrian não me pareceu particularmente alegre nesta manhã. Na verdade, ele parecia um farrapo. Seu cabelo não tinha o estilo cuidadosamente arrumado de sempre, e suas roupas – estranhamente boas para o horário – estavam amassadas. O cheiro de cigarros de bulbo pairava ao seu redor.

“É fácil chegar cedo quando não se dorme muito,” ele respondeu. “Fiquei de pé a noite toda esperando uma certa pessoa.”

“Esperando por – ah. Deus.” A festa. Eu tinha esquecido completamente da festa para a qual a mãe dele me convidou. Abe e Sydney tinha me distraído. “Adrian, eu sinto tanto.”

Ele se encolheu e não me tocou quando sentei no braço da sua cadeira. “Tanto faz. Provavelmente, eu nem devia ficar surpreso mais. Estou começando a notar que me iludo.”

“Não, não. Eu ia, mas você não vai acreditar no quê-”

“Guarde. Por favor.” Sua voz estava cansada, seus olhos injetados. “Não é necessário. Minha mãe me disse que viu você no interrogatório de Dimitri.”

Eu franzi as sobrancelhas. “Mas não foi por isso que perdi a festa. Tinha esse cara e -”

“Não é esse o ponto, Rose. O ponto é que você conseguiu tempo para isso – e para visitar a cela dele, se o que eu ouvi é verdade. Mesmo assim, você não pôde se prestar a aparecer para algo que disse que ia fazer comigo – ou até mesmo mandar uma mensagem. Era tudo que você tinha que fazer: dizer que não podia ir. Eu esperei mais de uma hora na casa dos meus pais antes de desistir.”

Eu comecei a dizer que ele podia ter tentado fazer contato, mas honestamente, ele devia? Não era responsabilidade dele. Fui eu quem disse a Daniella que encontraria com ele lá. Era minha culpa por não aparecer. 26 mai ?Rafaela?

“Adriam, me desculpe.” Eu apertei sua mão, mas ele não retribuiu. “Sério, eu queria, mas -”

“Não,” ele interrompeu de novo. “Desde que Dimitri voltou... não, risque isso. Desde que você ficou obcecada em mudá-lo, você se despedaçou sobre mim. Não importa o que acontecia entre nós, você nunca se entregou de verdade à nosso relacionamento. Eu queria acreditar no que me disse. Eu achei que estivesse pronta... mas você não estava.”

O protesto surgiu nos meus lábios mas, de novo, eu me impedi. Ele estava certo. Eu disse que daria uma chance justa ao namoro com ele. Eu até me afundei no papel confortável de namorada dele, mas o tempo todo... o tempo todo, parte de mim era consumida com Dimitri. Eu também sabia, mas mantive vidas separadas. Uma memória estranha dos tempos com Mason veio à mente. Eu tive a mesma vida dupla com ele, e ele morreu por causa disso. Eu era uma bagunça. Não conhecia meu próprio coração.

“Desculpe,” eu disse de novo. “Eu realmente queria que tivéssemos alguma coisa...” Mesmo para mim, aquelas palavras pareciam muito ridículas. Adrian deu um sorriso sabido.

“Eu não acredito nisso. Nem você.” Ele levantou e passou a mão pelos cabelos, não que isso ajudasse em algo. “Se quer mesmo ficar comigo, tem que ser de verdade dessa vez.”

Eu odiava vê-lo tão sombrio. E odiava especialmente ser a razão. Eu o segui até a porta. “Adrian, espera. Vamos conversar mais.”

“Agora não, pequena dhampir. Eu preciso dormir um pouco. Não aguento jogar esse jogo agora.”

Eu podia ter ido atrás dele. Eu podia ter jogado ele no chão. Mas não valia a pena... porque eu não tinha respostas para ele. Ele estava certo sobre tudo, e até eu arrumar a confusão que era minha cabeça, eu não tinha o direito de forçar uma conversa. Além disso, considerando o estado em que ele se encontrava, eu duvidava que outras tentativas pudessem ser produtivas. 26 mai ?Rafaela?

Mesmo assim, quando ele pisou lá fora, não pude segurar minhas próximas palavras. “Antes de você ir, - e eu entendo que você precisa – tem algo que preciso perguntar. Algo que não é sobre nós. Afeta – afeta Lissa.”

Isso o fez parar lentamente. “Sempre um favor.” Com um suspiro de quem está cansado do mundo, ele virou o rosto, me olhando por cima do ombro. “Seja rápida.”

“Alguém invadiu os registros dos Alchemists e roubou informações sobre o pai dela. Algumas eram coisas normais da história de vida dele, mas havia documentos sobre ele ter feito depósitos em uma conta bancária em Las Vegas. A conta bancária de uma mulher.”

Adrian esperou alguns momentos. “E?”

“E eu estou tentando descobrir por que alguém faria isso. Eu não quero ninguém se metendo na família dela. Você tem alguma ideia do que o pai dela estaria fazendo?”

“Você ouviu o cara no cassino. O pai dela ia muito lá. Talvez ele tivesse dívidas de jogo e estivesse pagando um agiota.”

“A família de Lissa sempre teve dinheiro,” eu apontei. “Não tem como ele ter contraído tantas dívidas. E por que alguém se importaria o bastante para roubar essa informação?”

Adrian jogou as mãos ao céu. “Eu não sei. Isso é tudo que eu tenho, ao menos a essa hora da manhã. Eu não tenho capacidade cerebral para intriga. Entretanto, não consigo imaginar nada disso sendo uma ameaça para Lissa.”

Eu aquiesci, desapontada. “Ok. Obrigada.”

Ele continuou em seu caminho, e eu o assisti ir. Lissa vivia perto dele, mas não queria que ele pensasse que eu o estava seguindo. Quando ele abriu distância o bastante, eu saí do prédio e comecei a caminhar na mesma direção. O som baixo de sinos me fez parar. Eu hesitei, subitamente inseguro sobre onde ir. 26 mai ?Rafaela?

Eu queria falar com Lissa e dizer o que Sydney me contara. Ela estava sozinha, até que enfim; era a chance perfeita. Ainda assim... os sinos. Era manhã de domingo. A missa ia começar na igreja da Corte. Eu tinha um pressentimento sobre alguma coisa, e apesar de tudo que havia acontecido – inclusive com Adrian – eu precisava ir e ver se eu estava certa.

Eu corri em direção à igreja, indo na direção oposta ao prédio de Lissa. As portas estavam fechadas quando cheguei ao meu destino, mas os poucos atrasados estavam tentando entrar discretamente. Eu fui com eles, parando para ajeitar meu comportamento. Nuvens de incenso flutuavam no ar, e meus olhos levaram um tempo para se adaptarem da luz do sol à luz de velas. Como essa igreja fazia parecer a capela de St. Vladimir uma anã, estava preenchida com muito mais gente que eu costumava ver em uma missa. A maioria dos assentos estava cheia.

Mas não todos.

Meu pressentimento estava certo. Dimitri estava em um dos bancos dos fundos. Alguns guardiões estavam com ele, claro, mas era isso. Mesmo em uma igreja lotada, ninguém mais sentou com ele no banco. Reece havia perguntado a Dimitri se ele pisaria na igreja ontem, e Dimitri foi um passo além, dizendo que ele iria até à missa de domingo.

O padre já havia começado a falar, então eu fui até o banco de Dimitri tão quieta quanto conseguia. O silêncio, entretanto, não importava, porque eu ainda atraia considerável atenção das pessoas próximas que estavam espantadas em me ver sentando perto do

Strigoi que virou dhampir. Olhos encaravam e diversas conversas sussurradas começaram.

Os guardiões haviam deixado algum espaço perto de Dimitri, então eu sentei ao seu lado, seu rosto demonstrando estar ao mesmo tempo surpreso e não surpreso por isso. 26 mai ?Rafaela?

“Não,” ele disse em uma voz baixa. “Não comece – não aqui.”

“Nem pensaria nisso, camarada,” eu murmurei de volta. “Só vim pelo bem de minha alma, isso é tudo.”

Ele não precisava dizer uma palavra para me fazer entender que ele duvidava que eu estivesse lá por razões sagradas. Mas eu fiquei quieta o tempo inteiro. Até mesmo eu respeitava alguns limites. Após vários minutos, a tensão no corpo de Dimitri diminuiu um pouco. Ele ficou alerta quando me uni a ele, mas eventualmente decidiu que eu manteria o bom comportamento. Sua atenção se desviou de mim e passou aos cantos e orações, e eu fiz meu melhor para assistí-los sem ser óbvia.

Dimitri costumava ir à capela da escola porque lhe trazia paz. Ele havia dito que mesmo que ele matasse para destruir o mal no mundo, ele ainda precisava pensar na vida e buscar perdão por seus pecados. Vendo ele agora, eu percebi que isso era mais verdadeiro que nunca.

Sua expressão era rara. Eu estava tão acostumada a vê-lo esconder suas emoções que era um um pouco espantoso ver traços delas em seu rosto. Ele estava absorto nas palavras do padre, sua face linda completamente focada. E eu percebi que ele estava entendendo tudo que o padre dizia sobre pecado pessoalmente. Pelo desespero em seu rosto, você pensaria que Dimitri sozinho era responsável por todos os pecados do mundo dos quais o padre falava.

Por um instante, eu pensei ter visto esperança do rosto de Dimitri também, só uma fagulha misturada com culpa e sofrimento. Não, eu percebi. Não esperança. Esperança significa que você acredita ter uma chance em alguma coisa. O que eu vi no rosto de Dimitri era saudade. Desejo. Dimitri desejava que, por estar nesse lugar sagrado e ouvir as palavras transmitidas, ele pudesse encontrar redenção pelo que fizera. Ainda assim... ao mesmo tempo, era óbvio que ele não acreditava que isso fosse possível. Ele queria isso mas nunca poderia ter, até onde ele sabia. 26 mai ?Rafaela?

Vendo ele assim me machucou. Eu não sabia como reagir àquela atitude desolada. Ele achava que não havia esperança para ele. Eu? Eu não podia imaginar um mundo sem esperança.

Eu também pensei que nunca citaria uma lição da igreja, mas quando o resto da multidão levantou para fazer a comunhão, eu me achei dizendo para Dimitri: “Você não acha que, se Deus pode, supostamente, perdoar você, é meio egoísta não perdoar a si mesmo?”

“Por quanto tempo você ficou esperando para usar essa frase comigo?” ele perguntou.

“Na verdade, acabou de vir à mente. Bem boa, né? Aposto que você pensou que eu não estava prestando a menor atenção.”

“Você não estava. Você nunca presta. Você estava me observando.”

Interessante. Para saber que eu o estava observando, Dimitri teria que ter me observado observando ele? Isso estava embrulhando minha cabeça. “Você não respondeu a pergunta.”

Ele manteve os olhos na fila da comunhão enquanto planejava sua resposta. “É irrelevante. Eu não preciso me perdoar mesmo que Deus o faça. E eu não tenho certeza de que Ele o faria.”

“O padre acabou de dizer que Deus faria. Ele disse que Deus perdoa tudo. Você está chamando o padre de mentiroso? Isso é um grande sacrilégio.”

Dimitri grunhiu. Eu nunca pensei que me divertiria atormentando ele, mas o olhar frustrado dele não era por causa de sua própria amargura. Era porque eu estava sendo impertinente. Eu vi essa expressão nele centena de vezes, e a familiaridade me trazia calor, por mais maluco que isso pareça.

“Rose, você é quem está cometendo sacrilégio. Está distorcendo a fé das pessoas por seus próprios objetivos. Você nunca acreditou em nada disso. Ainda não acredita.”

“Eu acredito que os mortos voltam a vida,” eu disse com seriedade. “A prova está bem ao meu lado. Se isso é verdade, acho que perdoar a si mesmo não é um passo tão grande.” 26 mai ?Rafaela?

Seu olhar endureceu, e se ele estava rezando por algo naquele momento, era que a comunhão se acelerasse para que ele pudesse sair dali e se afastar de mim. Nós dois sabíamos que ele tinha que esperar o fim do serviço da igreja. Se ele fugisse, ia fazer com que ele parecesse um Strigoi.

“Você não sabe do que está falando,” ele disse.

“Não?” eu silvei, me aproximando um pouco mais. Eu fiz isso para melhor demonstrar meu argumento, mas só serviu (para mim, ao menos) para me dar uma visão melhor de como a luz das velas brilhava em seu cabelo e quão alto e magro seu corpo era. Alguém parecia acreditar que ele era confiável o bastante para fazer a barba, e seu rosto estava macio, mostrando seus traços incríveis e perfeitos.

“Eu sei exatamente do que estou falando,” eu continuei, tentando ignorar a forma que sua presença me afetava. “Eu sei que você passou por muita coisa. Eu sei que fez coisas terríveis – eu vi isso. Mas está no passado. Estava além do seu controle. Não é como se você fosse fazer de novo.”

Um olhar estranho, assombrando, passou por seu rosto. “Como você sabe? Talvez o monstro não tenha partido. Talvez ainda haja um Strigoi dentro de mim.”

“Então você precisa derrotá-lo continuando com sua vida! E não é só pelo seu juramento cavalheiresco de proteger Lissa. Você precisa viver de novo. Precisa se abrir para as pessoas que o amam. Nenhum Strigoi faria isso. É assim que você salva a si mesmo.”

“Não posso ter pessoas me amando,” ele grunhiu. “Eu sou incapaz de amar qualquer um de volta.”

“Talvez você devesse tentar, ao invés de só sentir pena de si mesmo!”

“Não é tão fácil assim.”

“Dro-” eu quase não consegui impedir a mim mesma de xingar na igreja. “Nada que fizemos foi fácil! Nossa vida antes – antes do ataque não era fácil, e nós enfrentamos! Podemos enfrentar isso

também. Podemos enfrentar qualquer coisa juntos. Não me importa se põe a sua fé neste lugar. Eu não me importo. O que importa é que ponha sua fé em nós.” 26 mai ?Rafaela?

“Não existe nós. Eu lhe disse isso.”

“E você sabe que não sou uma boa ouvinte.”

Estávamos mantendo nossas vozes baixas, mas acho que nossos movimentos indicavam claramente uma discussão. Os outros estavam distraídos demais para perceber, mas os guardiões de Dimitri estavam nos observando cuidadosamente. Mais uma vez, eu lembrei a mim mesma do que tanto Lissa quando Mikhail disseram. Deixar Dimitri irritado em público não vai lhe fazer favor algum. O problema era, eu ainda não sabia dizer nada que não o irritasse.

“Eu queria que você não tivesse vindo aqui,” ele disse por fim. “É mesmo melhor para nós que nos afastemos.”

“É engraçado, porque eu podia jurar que você disse uma vez que nós éramos feitos um para o outro.”

“Eu quero que você fique longe de mim,” ele disse, ignorando meu comentário. “Eu não quero você tentando trazer de volta sentimentos que se foram. Isso é passado. Nada disso vai acontecer de novo. Nunca mais. É melhor para nós dois que passemos a agir como estranhos. É melhor para você.”

Os sentimentos amorosos, a compaixão que ele me provocou se aqueceram – para fúria. “Se você vai me dizer o que eu posso ou não posso fazer,” eu rugi no tom mais baixo que conseguia, “então ao menos tenha a coragem de dizer na minha cara!”

Ele se virou tão rápido que podia mesmo ser um Strigoi. Seu rosto estava cheio de... quê? Não a depressão anterior. Nem raiva, embora houvesse uma certa irritação. Havia mais, porém... um misto de desespero, frustração e talvez até medo. Acima de tudo isso estava a dor, como se ele sofresse de uma agonia terrível e única. 26 mai ?Rafaela?

“Eu não quero você aqui,” ele disse, os olhos em chamas. As palavras machucavam, mas algo nelas me excitava, da mesma forma que a agitação anterior pelos meus comentários zombeteiros tinha feito. Esse não era um Strigoi frio e calculista. Nem o homem derrotado na cela. Esse era meu velho instrutor, meu amante, que

atacava a tudo na vida com intensidade e paixão. “Quantas vezes preciso lhe dizer isso? Você precisa ficar longe de mim.”

“Mas você não vai me machucar. Eu sei.”

“Eu já machuquei você. Por que não entende isso? Quantas vezes eu preciso dizer isso?”

“Você me contou... contou antes de partir que me amava.” Minha voz tremia. “Como pode abandonar isso?”

“Porque é tarde demais! E é mais fácil que ser lembrado do que fiz com você!” Seu controle se foi, a voz ecoando pelo fundo da igreja. O padre e os outros em comunhão não notaram, mas nós definitivamente chamamos a atenção daquelas na metade de trás da igreja. Alguns dos guardiões ficaram rígidos e, de novo, eu tive que repetir o aviso para mim mesma. Não importa quão furioso Dimitri estava, quão traído eu me sentia... eu não podia arriscar que os outros pensassem que ele era perigoso. Dimitri dificilmente parecia que iria quebrar o pescoço de alguém, mas ele estava visivelmente incomodado, e alguns poderiam confundir sua frustração e sua dor por algo mais sinistro.

Eu dei as costas para ele, tentando acalmar minhas emoções em fúria. Quando olhei de novo, nossos olhos se encontraram, poder e eletricidade queimando entre nós. Dimitri podia ignorar tanto quanto quisesse, mas a conexão – o chamado profundo de nossas almas – ainda estava lá. Eu queria tocá-lo, não só com seu roçar em minha perna, mas com tudo. Eu queria envolvê-lo em meus braços e segurá-lo contra mim, assegurando que poderíamos fazer qualquer coisa juntos. Sem perceber, eu fui até ele, precisando desse toque. Ele se encolheu como se eu fosse uma cobra, e todos os guardiões foram para a frente, prontos para o que ele pudesse fazer. 26 mai ?Rafaela?

Mas ele não fez nada. Nada além de me encarar com um olhar que fez meu sangue gelar. Como se eu fosse algo estranho e ruim. “Rose. Por favor, pare. Por favor fique longe.” Ele estava se esforçando para ficar calmo.

Eu saltei, agora tão irritada e frustrada quanto ele. Eu tinha a sensação de que, se ficasse, nós dois explodiríamos. Em um tom baixo, eu murmurei, “Isso não está acabado. Eu não vou desistir de você.”

“Eu desisti de você,” ele disse, a voz também macia. “O amor some. O meu sumiu.”

Eu o encarei com descrença. Todo esse tempo, ele nunca disse isso daquela forma. Seus protestos sempre foram sobre um bem maior, sobre o remorso que ele sentia por ser um monstro ou como ele isso o destruiu para o amor. Eu desisti de você. O amor some. O meu sumiu.

Eu me afastei, a dor dessas palavras me atingindo tão forte quanto se ele tivesse me estapeado. Algo mudou em sua feição, como se ele soubesse o quanto me machucou. Eu não fiquei lá para ver. Ao invés disso, eu abri caminho para fora do corredor e corri pelas portas de trás, com medo de que, se eu ficasse um segundo a mais, todos na igreja me veriam chorar.

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