Chegar a Trey era mais fácil falar do que fazer. Que uma garota entrasse no
dormitório dos garotos em horários normais já era difícil, mas depois do toque de
recolher? No meio da noite? Quase impossível. Tive que recorrer a opções mais
criativas e chamei Eddie enquanto levava Adrian para casa. Uma das coisas pela
qual eu nunca deveria me sentir culpada era por chamar Eddie a qualquer hora.
Mantinha seu telefone ligado (para deleite de Micah, sem dúvida) e suspeitava que
dormia com o telefone ao lado de seu travesseiro.
- Sim? - a voz de Eddie estava desperta e preparada, como se nem
estivesse dormindo. Assim era como ele era.
- Preciso que vá ver se pode acordar o Trey - eu disse. - Sequestraram
Sonya e eles a tem retida em um recinto que tem um logo como a tatuagem de
Trey. Preciso averiguar o que ele sabe.
Esta era a primeira vez que Eddie ouvia sobre o sequestro de Sonya, mas
não pediu mais informações, nem tampouco como eu sabia a sua localização.
Sabia que ela tinha estado em perigo recentemente e essa rápida mensagem foi o
suficiente para fazê-lo atuar. Não sabia o que aconteceria quando Eddie
encontrasse Trey, vendo que não havia maneira de que eu mesma falasse com
Trey a não ser pela manhã. Ainda assim, tinhamos que começar por alguma parte.
- De acordo - disse Eddie. - Estou nisso. Já te chamo.
Desliguei e contive um bocejo.
- Bom, aqui vamos. Esperemos que Eddie possa averiguar alguma coisa.
- Preferivelmente sem golpear Trey no processo. - disse Adrian. Se enrolou
no assento do passageiro, o único sinal de que também estava se sentindo
cansado por nossa noite. Ele tinha a um tempo se convertido do horário noturno
de um vampiro. “É suposto que isso limitaria o que podemos averiguar.
Fiz cara feia.
- Se Trey está metido nisso de alguma forma, não acredito que queira ser
suave com ele. E ainda assim...não posso acreditar que ele esteja.
- As pessoas se enganam o tempo todo. Olhe você. Você crê que Trey sabe
que é parte de uma sociedade secreta que ajuda a manter os vampiros ocultos
desse mundo?
- Sinceramente...sim. - Me detive em uma luz vermelha e pensei no estranho
comportamento de Trey. - Ele sabe que Jill é uma Moroi, estou segura. Não se
deu conta no início, mas quando fez, seguiu me dizendo para que a escondesse.
Logo depois que Sonya foi atacada, disse que me cuidasse. - Um horrível
descobrimento passou a surgir em meu interior. - Ele sabia. Ele sabia que eu era
amiga de Sonya. Provavelmente sabia do ataque e não disse nada!
- Não é surpreendente se o grupo dele está trabalhando contra o seu. - O
tom de Adrian abrandou. - Se te faz sentir melhor, parece como se de certo modo
ele tem estado em conflito sobre tentar te advertir.
- Não sei se ele fez. Oh Adrian. - Parei na frente de seu edifício e vi o
Mustang amarelo iluminado pela luz pública. - Deixou o carro fora, tem sorte que
não foi rebocado.
- Eu vou tirá-lo. - Disse. - E não me olhe assim. Está em torno de um
perímetro de meio quilômetro. Não estou rompendo as regras.
- Só tenha cuidado. - murmurei.
Abriu a porta do Latte e olhou para mim.
- Tem certeza que quer voltar ao colégio? Estará presa ali até de manhã.
- De todas as formas não terá muito que eu posso fazer até então. Quero
estar ali no instante em que eu puder ter acesso a Trey. Confiarei em Eddie por
agora.
Adrian parecia relutante em me deixar, mas finalmente assentiu.
- Ligue se precisar de algo. Vou continuar tentando ver se posso encontrar
Sonya em seus sonhos. Não tive muita sorte antes.
Um dos mais desconcertantes poderes do espírito era a habilidade de entrar
no sonho de outras pessoas.
- É porque ela não está dormindo?
- Isso, ou ela está drogada.
Nenhuma das opções fazia com que me sentisse melhor. Me deu uma última
e persistente olhada antes de ir. Voltei a Amberwood onde um guia sonolento de
estudantes me disse que seguisse, sem comentários. Havia muito que a Sra.
Weathers havia ido para casa, e seu substituto noturno não parecia se importar
com minhas idas e vindas. Enquanto subia as escadas meu telefone tocou. Eddie.
- Bom, levou uma eternidade, mas finalmente acordei seu companheiro de
quarto. - me disse.
- E?
- Não está aqui. Creio que tampouco esteve aqui pela noite. Algo sobre uma
emergência familiar.”
- Não sabe quando ele volta? - Estava começando a pensar que todos os
“assuntos familiares” de Trey eram mais insidiosos do que havia suposto. Também
estava tentada a apostar que ele não era o único com a tatuagem do sol.
- Não.
Fiquei acordando a todo instante durante a noite. Meu corpo estava exausto
devido a magia, mas também estava ao limite por causa de Sonya para sucumbir
ante a fadiga. Fiquei levantando e verificando meu celular, temendo perder alguma
chamada, sem importar se estava no volume máximo. Finalmente me rendi e saí
da cama horas antes de começar o café da manhã do colégio. Depois de ter
tomado um banho e me vestido – e colocado minha cafeteira no máximo – estava
de volta nas horas liberadas do campus. Não é que me fizesse muito bem.
Fiz duas chamadas depois disso, primeira para Spencer para ver se Trey
estava trabalhando. Não esperava que estivesse, mas era uma boa desculpa para
saber se ele havia estado por ali nos últimos dias. Não havia estado. Minha
próxima chamada foi para Stanton, reportando o desaparecimento de Sonya.
Disse a ela que tinhamos uma pista que conectava um de meus companheiros
com os caçadores de vampiros e que Sonya provavelmente estava sendo retida
em um recinto fora da cidade. Não mencionei como eu sabia e Stanton estava
suficientemente distraída com o sequestro para perguntar algo.
No café da manhã, encontrei minha “família” com Micah na cafeteria. Os
rostos preocupados de Eddie, Angeline e Jill me dizia que todos sabiam do
sequestro de Sonya. Micah falava feliz sobre algo, e tinha o pressentimento de
que sua presença estava impedindo os outros de discutir sobre o que realmente
queriam. Micah perguntou algo a Eddie e eu me inclinei e murmurei para Jill.
- Tire-o daqui.
- Digo a ele para ir?” sussurrou ela.
- Se for necessário. Ou vá com ele.
- Mas quero...
Mordeu o lábio quando Micah voltou sua atenção para ela. Ela estava infeliz
pelo que teria que fazer, mas em seguida colocou sua expressão de segurança
que tanto havia visto esses dias. Apontou para o prato de Micah.
- Já terminou? Preciso perguntar algo para a Srta. Yamani. Vem comigo?
Micah se iluminou.
- Claro.
Uma vez que os dois se foram virei para Eddie e Angeline.
- Algum sinal de Trey? - perguntei
- Não. - disse Eddie - Conferi essa manhã. Seu companheiro de quarto está
começando a me odiar. Não posso culpá-lo.
- Isso está me enlouquecendo! - disse, sentindo que podia golpear minha
cabeça contra a parede. - Estamos tão perto, e ainda impotente. Cada minuto que
passa é um minuto que Sonya perde.
Ele fez uma careta.
- Estamos seguros de que ela está viva?
- Ela estava a noite. - disse.
Eddie e Angeline me olharam surpreendidos.
- Como sabe? - perguntou ela.
- Hum, bom, eu...não pode ser! - Minha boca se abriu enquanto olhava para
trás de Eddie. - É Trey!
Certamente um sonolento Trey acabara de entrar na cafeteria. Seu cabelo
úmido indicava que havia se lavado recentemente, mas tinha hematomas e
arranhões que não podia atribuir ao futebol.
Eddie já estava em ação antes que eu pudesse dizer outra palavra, e
Angeline e eu o seguimos rapidamente. Quase esperava que Eddie fosse derrubar
Trey ali mesmo. Em vez disso, Eddie caminhou para a frente de Trey o impedindo
de entrar na fila da comida. Cheguei a tempo de escutar Eddie dizer.
- Não tem café da manhã hoje. Você vem conosco.
Trey começou a protestar e depois viu eu e Angeline. Jill apareceu de
repente também, aparentemente tinha dado um perdido em Micah. Um olhar triste
cruzou as feições de Trey, quase derrotado, e assentiu, cansado.
- Vamos lá fora.
No momento em que saímos pela porta Eddie agarrou Trey e o empurrou
contra a parede.
- Onde está Sonya Karp? - disse Eddie. Trey parecia compreensivelmente
surpreendido. Eddie era magro e musculoso, mas muitos subestimavam o quão
forte ele era.
- Eddie, afaste! - eu disse, olhando preocupada ao nosso redor. Tinha
urgência, claro, mas nosso interrogatório não daria frutos se um professor visse e
acreditasse que estávamos molestando um estudante.
Eddie soltou Trey e deu um passo para trás, mas ainda havia um brilho
perigoso em seus olhos.
- Onde está o lugar em que a tem?
Isso pareceu despertar Trey de seu estado de inatividade.
- Como sabem isso?
- Nós fazemos as perguntas. - disse Eddie. Não voltou a tocar em Trey de
novo, mas sua proximidade e sua postura deixavam claro que ele chegaria aos
extremos se fosse necessário. - Sonya está viva?”
Trey titubeou, quase esperava que negasse seu conhecimento.
- S..sim, por agora.
Eddie explodiu outra vez. Agarrou a camisa de Trey e o puxou.
- Te juro que, se você e seu transtornado grupo colocarem uma mão em
cima dela...
- Eddie. – eu adverti.
Por um momento Eddie não se moveu. Logo, devagar, soltou a camisa de
Trey, mas ficando onde estava.
- Trey. – disse, usando o mesmo tom razoável que acabara de usar com
Eddie. Apesar de tudo Trey e eu éramos amigos, certo? – tem que nos ajudar. Por
favor nos ajude a encontrar Sonya.
Ele negou com a cabeça.
- Não posso Sydney. É para o seu próprio bem. Ela é malvada. Não sei que
truque ela aplicou com vocês ou como tem mantido essa ilusão que esconde sua
verdadeira identidade, mas não podem confiar nela. Se voltará contra vocês.
Deixe-nos...deixe-nos fazer o que temos que fazer.
As palavras eram todas corretas, junto com a linha da propaganda dos
Guerreiros. Mas, havia algo na maneira em que Trey falava, algo sobre sua
postura...não podia dizer que era o que me fazia duvidar dele. As pessoas me
incomodavam por causa da minha falta de habilidade em questões sociais, mas
estava quase certa de que ele não estava totalmente de acordo com o que esse
grupo queria que ele fizesse.
- Esse não é você Trey – disse – Te conheço bem para saber. Não mataria
uma mulher inocente.
- Ela não é inocente. – Aí estava outra vez, essa mescla de emoções.
Dúvida. – É um monstro. Você sabe sobre eles. Sabe o que podem fazer. Não são
como ela. – assentiu em direção a Jill. – São como os outros. Os mortos.
- Você vê Sonya como uma morta? – perguntou Eddie. – Você viu os olhos
vermelhos?
- Não. – admitiu Trey – mas temos outras provas. Testemunhas que a viram
em Kentucky. Reportes de suas vítimas.
Foi difícil manter a calma depois disso. Havia visto Sonya quando era uma
Strigoi. Ela era aterrorizante e se tivesse tido a oportunidade, teria matado a mim e
a meus companheiros. Era difícil aceitar isso quando um era convertido em Strigoi,
não estavam no controle de seus sentidos e de sua alma. Perdiam a conexão com
sua humanidade, ou o que tinham os Moroi, e não eram os mesmos que haviam
sido antes. Sonya havia feito coisas terríveis, espantosas, mas já não era essa
criatura.
- Sonya mudou – disse. – ela não é um deles.
- Os olhos de Trey se estreitaram.
- Isso é impossível. Estão sendo enganados. Há algum tipo de...não
sei...magia obscura em tudo isso.
- Isso não está nos levando a nada – grunhiu Eddie – chame Dimitri, nós dois
seremos capazes de fazer ele dizer onde é o local. Já invadi uma prisão antes.
Posso fazer de novo.
- Oh, você acha isso? - Um sorriso sem graça cruzou as características de
Trey. - Esse lugar é cercado com uma cerca elétrica e cheio de homens armados.
Além disso, ela está fortemente guardada. Você não pode simplesmente entrar lá.
- Por que ela ainda está viva? - perguntou Angeline. Ela pareceu perceber o
quão estranho que soou e foi rápida para elaborar. - Isso é...Quer dizer, eu estou
feliz que ela está. Mas se você acha que ela é tão mal, por que não acabar com
ela? - Ela olhou para os meus amigos e eu. - Sinto muito.
- É uma boa pergunta - Eddie disse a ela.
Trey levou um longo tempo para responder. Eu tinha uma sensação de que
ele estava dividido entre manter segredos do grupo e querendo justificar suas
ações para nós.
- Porque todos nós estamos sendo testados - disse ele finalmente. - Para ver
quem é digno de matá-la.
- Oh, meu Deus - disse Jill.
- Por isso todas as suas contusões recentemente - eu disse. Meus temores
de violência doméstica não estavam longe, realmente. - Você está competindo
para matar uma mulher que não tem feito nada para você.
- Pare de dizer isso! - Trey gritou, realmente olhando distraído. - Ela não é
inocente.
- Mas você não está tão certo - disse eu. – Ou sim? Seus olhos não estão
dizendo o mesmo que dizem seus amigos caçadores.
Ele fugiu da acusação.
- Minha família espera isso de mim. Principalmente depois de arruinar o
ataque no beco. Perdemos nossa autorização para matar ela, então, é por isso
que o conselho ordenou essas provas para nos redimirmos e provarmos que
somos capazes.
Ter “autorização” para matar alguém era repulsivo, mas foi o resto do que
havia dito que me fez pensar duas vezes.
- Você estava lá – disse incrédula – no beco, e...era você! Foi você que me
agarrrou! - Tudo voltou a mim novamente, a surpresa e a dúvida de meu atacante.
O rosto de Trey me confirmou.
- Sabia que era amiga deles. Pude dizer só de olhar, ainda que não
soubesse que eram vocês de imediato. – Isso tinha sido dirigido para Eddie e
Angeline. Trey se dirigiu a mim outra vez. – Reconheci sua tatuagem na primeira
vez que nos vimos. Ignorei porque não pensei que estava envolvida no que eu
estava. Pensei que só andasse com vampiros inofensivos, assim não esperava
que estivesse ali naquela noite. Não queria que se machucasse. Continuo não
querendo, e é por isso que precisa deixar isso passar.
- Cansei disso – disse Eddie. Era uma maravilha que tinha sido paciente todo
esse tempo. – Precisamos derrubar a porta desse lugar e...
- Espera, espera – uma ideia estava se formando em minha cabeça...e era
outra ideia louca. – Trey, disse que Eddie não pode entrar nesse lugar, mas eu
poderia?
- Do que está falando? – perguntou Trey, tinha uma mescla de surpresa e
confusão em seu rosto.
- Sabe quem sou. Sabe o que faço. – Trey assentiu. – Nossos dois grupos
podiam ser unidos. Aqueles caras que me detiveram no café disseram que
pensavam que devíamos trabalhar juntos. Os guerreiros querem os recursos dos
Alquimistas.
- Você que...quer um intercambio? – perguntou Trey, franzindo o cenho.
- Não. Só quero falar com o seu conselho. Quero explicar porque Sonya não
é...eh, porque ela não é mais como era antes. Tem um Moroi que usa um certo
tipo de magia que pode enclusive te mostrar...
- Não. – disse Trey imediatamente. – Nenhum deles teria permissão de
entrar. A vocês, híbridos, tampouco seriam permitidos. – De novo se dirigia a
Eddie e Angeline. Nunca havia escutado o termo “ híbrido” ser usado, mas seu
significado era claro.
- De acordo. – disse – Só humanos. Eu sou humana. Seu grupo quer
trabalhar com o meu grupo. Deixe-me ir com você. Desarmada. Falarei com seus
líderes e...
- Sydney não – protestou Eddie – Não pode ir lá sozinha! Vão decapitar a
Sonya, Santo Deus. E você lembra do que disse Clarence dos radicais que o
pegaram?
- Não ferimos humanos – disse Trey com firmeza – Estará segura.
- Acredito – eu disse – e também estou segura de que não deixará que algo
de mal me aconteça. Olha, não sente curiosidade sobre porque Sonya é como é?
Pode pensar que sua gente está comentendo um erro? Disse que tolerava os
Moroi. Ela é um deles. Me deixe explicar. Não estou pedindo nada mais do que
uma oportunidade para falar.
- E uma garantia de segurança – disse Angeline, que parecia tão ofendida
quanto Eddie. Ele assentiu ante suas palavras – Importa muito a honra certo? Tem
que prometer que ela estará bem.
- A honra é o que nos faz fazer o que fazemos – disse Trey – Se
prometemos que ela vai estar bem, ela estará.
- Então peça, por favor? Não faria isso por mim? Como meu amigo?
Um olhar de dor cruzou as feições de Trey ante isso. Havia feito alusão a
que me devia algo por tê-lo ajudado a encerrar o caso das tatuagens ilícitas. Isso
obrigaria qualquer amigo, sobretudo a um que haviam lhe inculcado um rígido
sentido de honra. Supus então, que algo mais do que honra estava em jogo aqui.
Trey e eu éramos amigos, com mais coisas em comum do que eu havia dado
conta. Ambos éramos parte de grupos que queriam controlar nossa vida, de
maneiras que não gostávamos. Também tínhamos pai dominante. Se Trey e eu
não tivéssemos metas tão opostas, poderíamos rir sobre isso.
- Eu perguntarei. – disse Trey. Algo me dizia que ele também estava
pensando em nossas similiaridades. – Porque é você. Mas não posso prometer
nada.
- Então pergunte agora. – grunhiu Eddie. – Não temos tempo a perder. E
imagino que Sonya tampouco.
Trey não negou. De repente estava perguntando-me se esta era uma
decisão inteligente. O que aconteceria se deixássemos que Trey saísse de nossas
vistas? Seria melhor se levássemos ele para Dimitri? E Sonya...quanto tempo lhe
restava?
- Agora – reiterei a Trey – Tem que contatá-los agora, não vai para a aula.
Era provavelmente a primeira e última vez que diria essas palavras.
- Eu juro – disse Trey – Vou ligar agora.
O sinal tocou, terminando nossa reunião. Ainda, se tivéssemos tido a
oportunidade de salvar Sonya justo agora, estava segura de que todos os meus
amigos saíram do campus nesse momento. Deixamos que Trey se fosse e ele se
dirigiu a seu dormitório, não para as aulas.
Angeline, recentemente liberada de sua suspensão, partiu com Jill enquanto
Eddie e eu seguimos para a aula de história.
- Isso foi um erro – disse, com o rosto sombrio quando olhou por onde Trey
havia ido – Por tudo que sabemos ele pode desaparecer e teremos perdido toda a
oportunidade de recuperar Sonya.
- Não creio que ele faça – disse eu – Conheço Trey. É uma boa pessoa, e
me dei conta de que ainda que creia que os Strigoi precisam ser exterminados,
não está cem por cento seguro sobre Sonya. Fará o que pode. Acredito que se
sente dividido agora mesmo, atrapalhado entre o que lhe disseram por toda a sua
vida e no que está começando a ver com seus olhos.
Parece com alguém que você conhece? Me perguntou uma voz interna.
Havia esperado que Trey me desse uma resposta em seguida...digamos que
na aula de química. Mas ele não estava ali e nem em nenhum lugar do colégio.
Supus que essas coisas levassem tempo, e minha paciência e fé se viram
recompensadas no final do dia com uma mensagem de sua parte: Ainda estou
verificando. Alguns estão dispostos a falar. Outros precisam ser convencidos.
Eddie não levou a mensagem de Trey como uma prova concreta quando
enviei, mas não acredito que Trey tivesse dito algo se tivesse saído da cidade.
Eddie queria se reunir com Dimitri e discutir estratégias tendo em conta este novo
acontecimento. Assim, decidimos fazer uma viagem grupal ao centro da cidade.
Eu enviei mensagens a nossa família para nos reunirmos fora do dormitório em
meia hora. Jill foi a primeira a chegar e se deteve em seco quando me viu.
- Sydney...seu cabelo.
Levantei o olhar de onde estava respondendo uma mensagem de Brayden,
dizendo que não podia sair esse fim de semana.
- O que tem ele?
- A maneira com que você arrumou as camadas. Fazem um complemento
perfeito em seu rosto.
Estava me olhando daquela forma estranha outra vez.
- Bom, sim – disse, esperando mudar o tema – É um, humm, bom corte de
cabelo. Lamento que teve que se livrar de Micah.
Levou alguns segundos, mas minha distração a tirou de seu transe induzido
por meu cabelo.
- Ah, não. Está bem, as coisas estão se tornando raras entre nós de toda
forma.
- Ah, verdade? – Micah parecia tão animado como sempre da última vez que
eu o vi. – Ainda tem problemas?
- Bom...acredito que sim. Eu gosto dele, de verdade. Eu gosto de sair com
ele e seus amigos. Mas eu só fico recordando que nada pode acontecer entre nós.
Como esta manhã. Há um mundo inteiro que ele não pode fazer parte. E eu não
suporto pensar em mentir ou excluí-lo de minha vida. Talvez tenha que fazer...de
verdade. Terminar as coisas. Sei que disse isso antes, mas agora é sério.
- Estamos aqui para você se fizer. - Tecnicamente estava sendo sincera,
mas se Jill viesse chorando para mim, não saberia o que fazer. Talvez poderia
encontrar um livro de técnicas sobre uma boa ruptura antes dela fazer.
Um sorriso cansado se estendeu em seu rosto.
- Sabe o que é bobo? Quero dizer, não quero ir saltando de um garoto para
outro, e me importo com Micah, mas estou começando a me dar conta de que
Eddie é um bom garoto.
- Ele é um grande garoto. – eu confirmei.
- Casais de Moroi e dhampirs são mal vistos, mas agora...quero dizer, há uns
que fizeram casais em St. Vladimir – riu angustiada – Eu sei, eu sei...sei que não
deveria estar pensando assim. Um garoto de cada vez. Mas mesmo
assim...quando vejo Eddie; é tão valente e tão seguro. Faria qualquer coisa por
nós, sabe? É como um herói em quadrinhos da vida real. Mas é tão dedicado que
provavelmente nunca se interessaria por alguém como eu. Não tem tempo para
garotas.
- Na realidade – disse – acredito que se interessaria muito por você.
Seus olhos se abriram.
- Sério?
Queria contar tudo. Em vez disso, escolhi minhas palavras cuidadosamente,
pouco disposta a revelar seus segredos depois que ele tinha falado para mim
deixar que ele cuidasse de seus próprios assuntos pessoais.
- Todo o tempo fala de como inteligente e competente você é. Acredito que
definitivamente estaria aberto para algo. – Também disse que não merecia seu
amor, mas esse pensamento poderia desaparecer se Jill se interessasse por ele.
Ela se perdeu em seus pensamentos e não disse mais nada do tema quando
Eddie e Angeline chegaram. Fomos até a cidade e deixei Jill e os dhampirs na
casa de Adrian, enquanto eu fazia alguns recados. Esperar Trey era agonizante e
eu precisava de uma distração. E me faziam falta umas coisas de Alquimista e
queria me assegurar de fazer tudo antes de entrar no acampamento dos
Guerreiros.
Meu telefone tocou quando estava empacotando. Era Trey, e saí da loja de
ervas em que estava, para atender a chamada.
- Tudo bem – disse ele – Está tudo pronto. Vão se reunir com você à
noite...só você.
Emoção e ansiedade passaram por meu corpo. Esta noite. Parecia
surpreendentemente pronto, ainda que isso era exatamente o que queria.
Precisávamos tirar Sonya dali.
- Vou te levar lá as sete em ponto – disse Trey – E...bom, eu sinto...mas terá
que ir com os olhos vendados. E estará certa de que nada nos siga. Se fizerem,
tudo acaba.
- Entendo. – disse, ainda que ir vendada fazia com que isso forre
aterrorizante. – Estarei pronta, obrigada Trey.
- E tem mais – continuou – queremos que nos devolvam a espada.
Fiz os arranjos para que ele me pegasse no Adrian, eu sabia que Eddie e
Dimitri teriam várias coisas para me dizer. Então, liguei para eles tão logo acabei
de falar com Trey, para avisá-los. Também liguei para Stanton, para atualizá-la.
Me ocorreu que deveria ter ligado antes, mas primeiro queria uma resposta
definitiva por parte de Trey.
- Não gosto da ideia de que vá sozinha. – me disse – Mas é pouco provável
que façam algo contra você. De verdade parece que se mantém longe dos
humanos, nós em particular. E se há uma oportunidade de tirar Karp de lá...bom.
Isso nos salvaria de muitos problemas com os Moroi. – O tom de Stanton me disse
que ainda que ela acreditasse que eu estaria bem, não era muito otimista a
respeito de Sonya. – Tenha cuidado, senhorita Sage.
O apartamento de Adrian estava cheio de tensão quando cheguei. Dimitri,
Eddie e Angeline estavam claramente inquietos, provavelmente porque eles
estavam sendo deixados de fora da ação. Adrian, surpreendentemente, também
parecia irritado, ainda que eu não soubesse o porque. Jill o olhava preocupada e
se mantiveram, olhando um para o outro, seguramente passando mensagens
entre si, através do laço. Por fim, através de apenas um olhar, era como se
tivessem terminado uma conversa. Jill suspirou e se dirigiu à cozinha com os
outros.
Comecei a falar com Adrian, mas Eddie me chamou.
- Estamos debatendo se devemos te dar uma arma ou não. – disse.
- Bom, a resposta é não – disse imediatamente – Vamos, eles vão me
vendar. Não acreditam que vão me revistar também?
- Deve haver uma maneira – disse Dimitri. Como estávamos com o ar
condicionado ligado ele tinha colocado seu sobretudo. – Não posso deixar que vá
para lá indefesa.
- Não estou em perigo – disse, sentindo que havia repetido o mesmo todo o
dia. – Pode ser que estejam loucos, mas Trey disse que se dão sua palavra, a
cumprem.
- Sonya não tem essa garantia. – disse Dimitri.
- Nenhuma arma vai me ajudar a salvá-la. – disse – Exceto por meu
raciocínio. E estou preparada com isso o melhor que posso.
Os dhampirs não estavam felizes. Seguiram discutindo entre eles e eu os
deixei para pegar água. Adrian gritou da sala.
- Tem refrigerante dietético aí dentro.
Abri a geladeira, e certamente estava vendo todo o tipo de refrigerante. E
tinha mais comida do que jamais tinha visto. Outro benefício da generosidade de
Nathan Ivashkov. Peguei uma lata de Coca Cola dietética e me reuní a Adrian no
sofá.
- Obrigada – disse, abrindo a lata – Esta é a segunda melhor coisa que pode
ter depois do sorvete.
Ele levantou uma sobrancelha.
- Sorvete? Soa como uma sobremesa, Sage.
- E é – admiti. O tema mundano era reconfortante entre toda a tensão. – É
em parte sua culpa por trazer a tona ontem. Agora não posso deixar de pensar
nisso. Queria um pouco no jantar, e Brayden me convenceu de não comê-lo, o
que é provavelmente o porque eu estou tão obcecada com isso. Alguma vez
aconteceu com você? Alguma vez não poder ter algo e o querer ainda mais.
- Sim – disse amargamente – Acontece todo o tempo.
- Porque está tão desanimado? Também pensa que eu deveria levar uma
arma? – Com Adrian era realmente difícil saber onde levaria seu estado de ânimo.
- Não, entendo seu ponto, e penso que está correta. – disse. – Ainda que eu
não goste da ideia de você ir lá.
- Tenho que ajudar a Sonya. – disse.
- Sei que tem que fazer. Desejaria poder ir com você.
- Ah, verdade? Vai me proteger e me tirar de lá como fez a noite? – o
provoquei.
- Sim, se é o que precisa. Você e Sonya. Colocaria uma em cada ombro.
Muito viril, certo?
- Muito – disse, feliz de vê-lo brincando de novo.
Sua diversão desapareceu e voltou a ficar sério.
- Deixe eu perguntar algo. O que é mais assustador: entrar em um covil de
humanos loucos assassinos ou estar segura, ainda que de certo modo selvagem,
com vampiros e meio vampiros? Sei do temor que você e os Alquimistas tem da
gente, mas..é a lealdade a sua própria raça tão forte que...não sei...que as
pessoas em si não importam?
Era uma pergunta surpreendentemente profunda para Adrian. Também fazia
alusão a minha viagem ao centro de reeducação dos Alquimistas para visitar
Keith. Me lembrei como o pai de Keith não havia se importado com os valores
morais de seu filho sempre e quando significava que Keith não tivesse boas
relações com os vampiros. Também me levou a pensar no café e em como os
Guerreiros não queriam escutar outra verdade que não fosse a sua. E finalmente,
olhei para os dhampirs discutindo na cozinha, pensando em maneiras encobertas
de manter eu e Sonya seguras sem importar os riscos.
Olhei para Adrian.
- Eu fico com os vampiros. Minha lealdade a minha própria raça vai até certo
ponto.
Algo no rosto de Adrian se transformou, mas não prestei muita atenção.
Estava muito impactada dando-me conta que as palavras que acabava de dizer
podiam ser consideradas como alta traição entre os Alquimistas.
Eddie e Angeline foram buscar o jantar e os deixei pegar meu carro, desde
que Eddie dirigisse. Enquanto eles estavam fora, Dimitri me ensinou algumas
técnicas de auto defesa, mas era difícil aprender muito em tão pouco tempo.
Continuava pensando no que Wolfe havia dito de evitarmos lugares perigosos. O
que diria de mim se soubesse que iria entrar no esconderijo de caçadores de
vampiros?
Eddie e Angeline estiveram fora por um bom tempo e lregressaram,
desanimados por todo o tempo que o restaurante havia demorado.
Não pensei que chegaríamos a tempo – disse Eddie – Tinha medo que não
teria tempo de comer antes da sua missão.
- Nem sequer sei se posso comer – admiti. Apesar de minhas palavras
valentes de antes, estava começando a ficar nervosa. – Oh, pode ficar com essas
no caso de precisar do carro.
Ele havia caminhado até minha bolsa com as chaves e as havia deixado ali
de todas as formas.
- Tem certeza?
- Tenho.
Ele encolheu os ombros e pegou as chaves outra vez. Adrian, para minha
surpresa, o olhou com os olhos semicerrados e parecia incomodado com algo.
Não podia suportar suas mudanças de humor hoje. Se levantou e caminhou até
Eddie. Depois de uns momentos, se afastaram mais e pareciam estar tendo uma
discussão em voz baixa, uma que incluía umas olhadas para mim. Todo mundo
parecia incomodado e começaram a falar de qualquer coisa que vinha a mente.
Só podia olhar de um lado a outro, sentindo que havia perdido algo importante.
Trey me chamou as sete em ponto, dizendo que estava me esperando lá
fora. Me levantei e peguei a espada, respirando profundamente.
- Desejem-me sorte.
- Te acompanho lá fora. – disse Adrian.
- Adrian. – o advertiu Dimitri.
Adrian revirou os olhos.
- Eu sei, eu sei. Não se preocupe. Eu prometi.
Prometeu o que? Nada havia sido explicado.
Não havia muito o que caminhar já que ele vivia no primeiro andar, mas
quando saímos, me reteve com suas mãos em meus braços. Um tremor me bateu,
tanto pelo contato como pelo inesperado gesto. Suas únicas demostrações de
ternura eram com Jill.
- Sage – disse – É sério, tome cuidado. Não seja uma heroína, temos muito
disso aqui. E...não importa o que aconteça, quero que saiba que nunca duvidei do
que vai fazer. É inteligente, e é valente.
- Fala como se já tivesse acontecido e falhado. – disse
- Não, não. Eu só...bom, quero que saiba que eu confio em você.
- De acordo – disse me sentindo um pouco confusa. Outra vez sentia que
não estavam me dizendo algo. – Espero que meu plano funcione.
Precisava me afastar, me soltar do agarro de Adrian, mas não podia fazer.
Tinha dúvidas, por alguma razão. Havia segurança e comodidade aqui. Uma vez
fora, realmente estaria caminhando para a jaula do leão. Fiquei uns momentos
mais, segura no círculo que havíamos feito, e logo, de má vontade, me afastei.
- Por favor tenha cuidado – repetiu – Volte a salvo.
- Eu terei. – Por impulso tirei meu crucifixo e coloquei em sua mão – Desta
vez, guarde-o, é serio. Guarde até que eu volte. Se você se preocupar muito, olhe
e pense que terei que voltar para buscá-lo. Ele realmente cai bem com calça caqui
e cores neutras.
Me preocupava que ele me devolveria, mas simplesmente assentiu e apertou
a cruz. Me afastei, sentindo um pouco vulnerável sem o crucifixo, mas esperava
que lhe desse confiança. Meu incômodo de repente parecia algo pequeno, queria
que Adrian estivesse bem.
Sentei no banco do passageiro no carro de Trey e imediatamente dei a
espada. Ele parecia tão miserável quanto antes.
- Tem certeza de que quer fazer isso?
Porque todo mundo continuava me perguntando isso?
- Sim. Absolutamente.
- Me dê seu celular.
Eu entreguei e ele o desligou. Me devolveu, junto com uma venda.
- Vou confiar em você para que coloque isso.
- Obrigada.
Comecei a colocar a venda e logo, impulsivamente voltei a olhar o edifício
uma última vez. Adrian ainda estava ali de pé, com as mãos nos bolsos, e o rosto
preocupado. Vendo que o olhava, logo sorriu e levantou uma mão em...que?
Despedida? Benção? Eu não sabia, mas me fez sentir melhor. A última coisa que
eu vi foi o reflexo da cruz na luz do sol justo antes de cobrir os olhos com a venda.
Sumi na obscuridade.
sexta-feira, 8 de agosto de 2014
Capitulo 20
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às 17:08
Marcadores: Bloodlines, O Lírio Dourado
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