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sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Capitulo 24

Devido ao fato de que este dia não poderia ser mais estranho, decidi parar

no apartamento de Adrian. Havia algo que estava morrendo por saber, mas não

tinha tido oportunidade de perguntar.

Ele abriu a porta quando toquei a campainha, um pincel na mão.

- Oh – disse – Inesperado.

- Estou interrompendo algo?

- Só o trabalho. – Se afastou para me deixar entrar – Não se preocupe. Não

é uma crise para mim como seria para você.

Entrei na sala de estar e estava feliz de vê-la com telas e cavaletes de novo.

- Recuperou seu estúdio de arte.

- Sim. – Deixou o pincel e limpou as mãos num trapo. – Agora que este lugar

não é mais uma central de investigação, pode voltar a seu estado artístico normal.

Se inclinou contra a parte posterior do sofá xadrez e me observou enquanto

eu passeava de tela em tela. Uma delas me deteve.

- O que é isso? Parece com um lírio.

- E é – disse – Não se ofenda, mas este lírio é um pouco mais rude que

o´seu. Se os Alquimistas quiserem comprar os direitos deste e começar a usá-lo

estou disposto a negociar.

- Tomarei nota – disse. Todavia estava sorrindo por causa do término com

Brayden e isso só aumentava meu bom humor. Ainda que, certamente, a pintura

havia me desorientado um pouco, como o caráter abstrato da sua arte usualmente

fazia. O lírio, apesar de ser mais estilizado e “rude” do que o da minha bochecha,

era claramente identificável. Inclusive estava feito em uma pintura dourada.

Pinceladas de pintura roxa sem forma rodeavam, e ao redor do roxo havia padrão

quase cristalino de azul céu. Era surpreendente, mas se havia algum significado

mais profundo, estava além do meu entendimento.

- Está com um humor terrivelmente bom – disse – Teve redução caqui para

tudo?

Renunciei minha interpretação artística e me virei para ele.

- Nope. Brayden terminou comigo.

O sorriso de Adrian sumiu.

- Ah. Merda. Sinto muito. Está...quero dizer, precisa de uma bebida? Precisa,

uh, chorar ou algo assim?

Eu ri.

- Não. Estranhamente estou bem. Na verdade não me incomoda em

absoluto. Mas deveria, não é? Talvez haja algo errado comigo.

Os olhos verdes de Adrian me analisaram.

- Não creio. Não são todas as rupturas que são uma tragédia. Ainda

assim...poderia precisar de um pouco de consolo.

Se endireitou e caminhou até a cozinha. Perplexa observei enquanto ele

pegava algo do congelador e de sua gaveta de talheres. Voltou para a sala e me

entregou um litro de sorvete de romã e uma colher.

- Para que é isso? - Perguntei, aceitando o oferecimento com uma careta de

surpresa.

- Para você, obviamente. Queria romã, certo?

Lembrei da noite no restaurante italiano.

- Bem, sim, mas não precisava fazer isso...

- Bem, eu queria – disse razoavelmente – Isso, e um trato é um trato.

- Que trato?

- Se lembra quando disseste que tomaria uma lata de refrigerante com

açúcar se eu não fumasse por um dia? Bom, calculei as calorias, e isso é o

mesmo que uma porção disso. Você pode acreditar que tem quatro porções nessa

coisa.

Quase deixei cair o sorvete.

- Você...passou um dia sem fumar?

- Quase uma semana, na realidade – disse – Assim você pode comer tudo

se quiser.

- Porque raios faria isso? – perguntei.

Ele encolheu os ombros.

- Olha, você propôs o desafio. Além do mais, fumar é um hábito pouco

saudável, certo?

- Certo... – Todavia estava aturdida.

- Come. Vai derreter.

Devolvi o sorvete.

- Não posso. Não com você observando. É muito estranho. Posso comê-lo

mais tarde?

- Claro – disse, colocando o sorvete no congelador – Se realmente você

comer. Sei como você é.

Cruzei os braços enquanto ele permanecia de pé em frente a mim.

- Oh?

Me olhou de uma forma desconcertantemente dura.

- Talvez todos os demais acreditam que sua aversão por comida é lindo, mas

eu não. Te vejo observar Jill. Aqui vai um pouco de amor duro: nunca, jamais terá

o corpo de Jill. Jamais. É impossível. Ela é Moroi. Você é humana. Isso é biologia.

Tem um corpo grandioso, um que a maioria das humanas matariam...e você

ficaria melhor se ganhasse um pouco de peso. Cinco quilos seria um bom

começo. Esconder as costelas. Obter um tamanho maior de sutiã.

- Adrian! – estava atônita. – Está...está louco? Não tem o direito de me dizer

isso. Para nada.

Ele franziu o cenho.

- Tenho todo o direito, Sage. Sou teu amigo e ninguém mais vai dizer. E, sou

o rei dos hábitos pouco saudáveis. Acredita que não reconheço um quando vejo?

Não sei de onde veio isso, de sua família, de muitos Moroi, ou só a sua própria

natureza obssessivo-compulsivo, mas eu te digo, não tem que fazer.

- Suponho que esse é um tipo de intervenção.

- Essa é a verdade – disse – De alguém que se preocupa e quer que seu

corpo seja tão saudável e surpreendente quanto sua mente.

- Não vou escutar isso – disse, dando a volta. Uma mescla de emoções se

agitou. Ira. Indignação. E estranhamente, um pouco de alívio. – Vou embora, não

deveria ter vindo.

Sua mão sobre meu ombro me deteve.

- Espera...me escuta – De má vontade me virei. Sua expressão era severa,

mas sua voz havia se suavizado. – Não estou tratando de ser mal. É a última

pessoa que quero ferir...mas tampouco quero que fira a você mesma. Pode

ignorar tudo o que acabei de dizer, mas eu tive que dizer, ok? Não mencionarei de

novo. É a que tem o controle da sua vida.

Olhei para longe e pisquei para afastar as lágrimas.

- Obrigada. – disse. Deveria estar feliz de que ele voltou atrás. Em seu lugar,

havia uma dor em meu interior, como se tivesse rasgado algo que estava tentando

ignorar e manter escondido. Uma verdade terrível que eu não queria admitir para

mim mesma, que sabia que era hipócrita para alguém que dizia lidar com fatos e

dados. E quisesse estar de acordo com ele ou não, eu sabia, sem dúvida, que

tinha razão sobre algo: ninguém mais teria dito o que ele acabara de me dizer.

- Porque você veio de toda forma? – perguntou. – Tem certeza de que não

quer que minha impressionante pintura seja o novo logo dos Alquimistas?

Não pude evitar um pequeno sorriso. Voltei a olhar para ele, disposta a

ajudá-lo com a abrupta mudança de assunto.

- Não. Algo muito mais sério.

Pareceu aliviado ante meu sorriso e me deu um de seus sorrisos de volta.

- Deve ser verdadeiramente sério.

- A noite no complexo. Como sabia como conduzir o Mustang?

Seu sorriso desapareceu.

- Porque você fez – disse. - Conduziu sem nenhuma vacilação. Tão bem

quanto eu podia fazer. Mas imagino que mesmo se tivesse tomado aula todos os

dias desde que comprou o carro, não poderia dirigir daquele jeito. Você dirigiu

como se estivesse dirigindo de forma natural por toda sua vida.

Adrian se virou abruptamente e caminhou para o lado oposto da sala.

- Talvez seja instintivo. – disse, sem se virar.

Era engraçado quão rápido haviam mudado os papéis. Há um minuto havia

me encurralado em uma esquina, obrigando-me a enfrentar problemas que não

queria. Agora era minha vez. O segui até a janela e o fiz encontrar meu olhar.

- Tenho razão certo? - O pressionei – Tem estado dirigindo por toda sua

vida.

- Nem sequer os Moroi dão licença para recém-nascidos, Sage. – disse com

ironia.

- Não fuja disso. Sabe o que quero dizer. Sabe dirigir com marcha durante

anos.

Seu silêncio respondeu por ele, dizendo-me que tinha razão, mesmo se seu

rosto era difícil de ler.

- Porque? – exigi. Estava quase implorando. Todos diziam que eu era tão

excepcionalmente inteligente, que podia conectar coisas ao azar e chegar a

conclusões notáveis. Mas isso estava além da minha compreensão, e não podia

manusear algo que tinha tão pouco sentido. – Porque faria isso? Porque atuaria

como se não soubesse dirigir?

Um monte de pensamentos pareceram cruzar sua mente, nenhum dos quais

ele queria compartilhar. No final, sacudiu a cabeça com exasperação.

- Não é óbvio Sage? Não, claro que não é. Fiz porque assim teria uma razão

para ficar perto de você...uma que sabia que você não poderia recusar.

Estava mais confusa ainda.

- Mas..porque? Porque queria fazer isso?

- Porque? – perguntou – Era o mais perto que podia chegar para fazer isso.

Se esticou e me puxou para ele, uma mão na minha cintura e a outra no meu

pescoço. Inclinou minha cabeça para cima e baixou seus lábios nos meus. Fechei

meus olhos e me derreti enquanto meu corpo inteiro era consumido pelo beijo. Eu

não era nada. Eu era tudo. Calafrios circulavam pela minha pele, envolvi meus

braços ao redor de seu pescoço. Seus lábios eram mais quentes e mais suaves

do que eu pudera imaginar e ainda assim feroz e poderosos ao mesmo tempo. Os

meus responderam avidamente e me agarrei a ele. Seus dedos deslizaram pela

parte posterior do meu pescoço, seguindo sua forma, e cada lugar que tocava era

eletrizado.

Mas, talvez, a melhor parte de tudo isso era que eu Sydney Katherine Sage,

culpada de analisar constantemente o mundo ao meu redor, bom, eu parei de

pensar.

E isso foi glorioso.

Ao menos foi até que eu voltei a pensar de novo.

Minha mente e todas as suas preocupações e considerações repentinamente

tomaram o controle. Me afastei de Adrian, apesar dos protestos de meu corpo.

Retrocedi, sabendo que meus olhos estavam aterrorizados e muito abertos.

- O que...o que está fazendo?

- Eu não sei – disse com um sorriso. Deu um passo para mim. – Mas estou

bastante seguro de que estava fazendo também.

- Não. Não. Não chegue mais perto! Não pode fazer isso outra vez. Entende?

Não podemos...Não deveríamos fazer...oh Meu Deus. Não. Nunca mais. Isso está

mal. – Coloquei meus dedos sobre meus lábios, como se fosse limpar o que

acabava de acontecer, mas sobretudo foi para recordar outra vez a doçura e o

calor de sua boca contra a minha. Rapidamente deixei cair minha mão.

- Mal? Eu não sei, Sage. Honestamente, isso foi o mais correto que já me

aconteceu durante um tempo.

Contudo, mantive distância.

Sacudi minha cabeça freneticamente.

- Como pode dizer isso? Sabe como são as coisas! Não há...bom, já sabe.

Os humanos e os vampiros não podem...não. Não pode haver algo entre eles.

Entre nós.

- Bem, teve que ser assim em algum momento. – disse, tentando um tom

razoável. – Ou não haveriam dhampirs hoje. Além do mais, o que me diz dos

Vigilantes?

- Os Vigilantes? – Quase ri, mas nada disso era divertido. – Os Vigilantes

vivem em cavernas e iniciam batalhas ao redor de fogueiras por um ensopado de

gambá. Se quer viver essa vida, é mais do que bem vindo a fazer. Se quer viver

no mundo civilizado com o resto de nós, então não me toque de novo. E Rose?

Não estava loucamente apaixonado por ela?

Adrian parecia muito calmo para a situação.

- Talvez eu estive uma vez. Mas foi a...o que, cerca de três meses? E

honestamente, não tenho pensado muito nela há um tempo. Sim, estou ferido e

me sinto um pouco usado, mas...na realidade, ela já não é em quem sempre estou

pensando. Não vejo seu rosto quando vou dormir. Não me pergunto sobre...

- Não. – retrocedi para mais longe. – Não quero escutar isso. Não vou

escutar isso.

Com uns quantos passos rápidos, Adrian parou na minha frente outra vez. A

parede estava a alguns centímetros atrás de mim, e não tinha aonde ir. Não fez

movimentos ameaçadores, mas apertou minhas mãos e as colocou contra seu

peito enquanto se inclinava para mim.

- Não, escutará. Por uma vez, vai escutar algo que não encaixa no seu

mundo ordenado, organizado em compartimentos de ordem, lógica e razão.

Porque isso não é razoável. Se está assustada, acredite...isso também me

assusta como o inferno. Perguntou por Rose? Tentei ser uma pessoa melhor por

ela, mas isso foi para impressioná-la, para fazer com que me quisesse. Mas

quando estou perto de você, quero ser melhor porque...bom, porque parece certo.

Porque quero fazer. Me faz querer ser uma pessoa melhor do que eu mesmo. Me

inspira em cada ato, cada palavra, cada olhar. Te olho, e é como...como a luz feita

de carne e osso. Eu disse no Halloween e quis dizer cada palavra: é a criatura

mais bonita que alguma vez já vi caminhar neste mundo. E nem sequer sabe. Não

tem ideia do quão bonita que é, o quão brilhante é sua chama.

Sabia que tinha que me separar, retirar minhas mãos das suas. Mas não

pude.

- Adrian...

- Eu sei, Sage – continuou, seus olhos cheios de fogo – Sei como vocês se

sentem sobre nós. Não sou estúpido, acredite, tenho tentado te tirar da minha

cabeça. Mas não há suficiente licor ou arte ou qualquer outra distração no mundo

que faça. Tive que deixar de ir as aulas de Wolfe porque era muito difícil ficar perto

de você, mesmo que fosse simplesmente fingir lutar. Não podia suportar o contato.

Estava agonizando porque significava algo para mim, porque sabia que não

significava nada para você. Me dizia que devia me manter afastado por completo e

então encontrava desculpas...como o carro...ou qualquer coisa para estar perto de

você de novo. Hayden era um imbecil, mas pelo menos enquanto estava com ele,

tive uma razão para manter distância.

Adrian segurava minhas mãos, seu rosto ansioso, assustado e desesperado

enquanto derramava seu coração para mim. Meu próprio coração estava batendo

descontrolavelmente, e qualquer quantidade de emoções poderia ser o culpado.

Tinha esse olhar distraído, extasiado...o que teve quando o espírito se apoderou

dele e o fez divagar. Rezei para que se tratasse disso, algum ataque de loucura

induzido por espírito. Tinha que ser. Verdade?

- Seu nome é Brayden – disso afinal. Lentamente, fui capaz de acalmar

minha ansiedade e ganhar algum controle – E mesmo sem ele, tem um monte de

razões para manter a distância. Disse que sabe como nos sentimos. Mas é assim?

De verdade, é assim? – Retirei minhas mãos da sua e apontei para minha

bochecha. – Sabe o que o lírio dourado significa verdadeiramente? É uma

promessa, um voto de um estilo de vida e um sistema de crenças. Não pode

deixar algo como isso. Isso não me deixará, mesmo se eu quiser fazer. E

verdadeiramente, não quero fazer. Creio no que fazemos.

Adrian me olhou desapaixonadamente. Não tentou pegar minhas mãos outra

vez, mas tampouco retrocedeu. Minhas mãos se sentiam dolorosamente vazias

sem as suas.

- Esse “estilo de vida” e “sistema de crenças” que está defendendo te usou e

segue te usando. Te tratam como a peça de uma máquina, uma que não tem

permissão para pensar...e você é muito melhor do que isso.

- Algumas partes do sistema são defeituosas – admiti – Mas os princípios

são sólidos e eu acredito neles. Há uma brecha entre humanos e vampiros, entre

você e eu, que nunca pode ser infrigida. Somos muito diferentes. Não estamos

destinados a estar...desta maneira. De nenhuma maneira.

- Nenhum de nós está destinado a ser ou a fazer algo – disse – Decidimos o

que vamos ser. Me disse uma vez que não há vítimas aqui, que todos temos o

poder de escolher o que queremos.

- Não use minhas próprias palavras contra mim. – adverti.

- Porque? – perguntou, um sorriso ligeiro em seus lábios. – São

malditamente boas. Não é uma vítima. Não é uma prisioneira desse lírio. Pode

escolher o que quiser.

- Tem razão – Afastei, não encontrando resistência de sua parte. – E eu não

te escolho. Isso é o que você está perdendo em tudo isso.

Adrian ficou em silêncio. Seu sorriso desapareceu.

- Não acredito em você.

Franzi o cenho.

- Deixe-me adivinhar. Porque correspondi ao beijo? – Esse beijo havia me

feito sentir mais viva do que havia estado em semanas, e tinha a sensação de que

ele sabia disso.

Sacudiu sua cabeça.

- Não. Porque não há ninguém lá fora que te entenda como eu entendo.

Esperei por mais.

- Isso é tudo? Não vai elaborar o significado disso?

Aqueles olhos verdes me detiveram.

- Não acredito que precise fazer.

Tive que desviar o olhar, ainda que não estava certa do porque.

- Se me conhece tão bem, então entenderá porque eu vou embora.

- Sydney...

Fui rapidamente em direção a porta.

- Adeus, Adrian.

Me apressei para a porta, um pouco assustada de que ele tentasse me deter

outra vez. Se ele fizesse, não estava segura de que poderia ir. Mas não chegou

nenhum toque. Nenhum esforço para me deter. Não foi até que estava a meio

caminho do lado de fora, na grama em frente a seu edifício que me atrevi a olhar

para trás. Adrian estava parado ali, inclinado contra a porta, observando-me com o

seu coração em seus olhos. Em meu peito, meu próprio coração estava se

rompendo. Sobre minha bochecha, o lírio me lembrava de quem eu era.

Virei as costas e fui embora, me negando a olhar para trás.

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