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sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Capitulo 4

10:12 da manhã






Quando minha ambulância chega ao hospital mais próximo – não o da

minha cidade natal mas em um pequeno lugar que parecia mais como uma

antiga casa do que um centro médico – os médicos me levam com pressa para

dentro. “Eu acho que temos um pulmão perfurado. Coloquem um tubo no peito

dela e movam ela para fora daqui!” a gentil médica ruiva grita enquanto me

passa para um time de enfermeiras e doutores.

“Onde está o resto?” pergunta um cara com barba.

“O outro motorista sofreu uma concussão leve, está sendo tratado no

local. Os pai faleceram. Garoto, aproximadamente 7 anos, logo atrás de nós.”

Eu exalo profundamente, como se estivesse segurando meu fôlego nos

últimos 20 minutos. Depois de me ver naquela vala, eu não fui capaz de

procurar por Teddy. Se ele estivesse como mamãe e papai, como eu, eu... eu

não queria nem pensar nisso. Mas ele não estava. Ele estava vivo.

Eles me levam para um pequeno quarto com luzes brilhantes. Um doutor

coloca uma coisa laranja no lado do meu peito e então coloca um pequeno tubo

plástico em mim.Outro doutor coloca uma lanterna em meu olho. “Sem

resposta,” ele diz a enfermeira. “O helicóptero está aqui. Leve ela para o

Trauma. Agora!”

Eles correm comigo para fora da Emergência para dentro de um

elevador. Eu tenho que correr para acompanhar. Logo antes das portas

fecharem, eu noto que Willow está aqui. O que é estranho. Nós deveríamos

estar visitando ela e Henry e o bebê em casa. Ela foi chamada por causa da

neve? Por nossa causa? Ela corre no corredor do hospital, seu rosto uma

mascara de concentração. Eu não acho que ela sequer saiba que somos nós

ainda. Talvez ela tenha até tentado ligar, deixado uma mensagem no celular de

mamãe, se desculpando por ter havido uma emergência e ela não ser capaz de

estar em casa para nossa visita.

O elevador se abre no telhado. Um helicóptero, suas laminas cortando o

ar, está no meio de um enorme circulo vermelho.

Eu nunca andei de helicóptero antes. Minha melhor amiga, Kim, andou.

Ela foi em um voou sobre o Monte St. Helens uma vez com seu tio, um fotografo

figurão da National Geographic.

“Lá estava ele, falando sobre a flora pós vulcânica e eu vomitei nele,” Kim

me disse no dia seguinte. Ela ainda parecia um pouco verde por causa da

experiência.

Kim faz o anuário e tem esperanças de se tornar uma fotografa. Seu tipo

a levou nessa viagem como um favor, para nutrir seu crescente talento.”Até

acertei em algumas de suas câmeras,” Kim lamentou. “Eu nunca serei uma

fotografa agora.”

“Tem todo tipo diferente de fotógrafos,” eu disse a ela. “Você não precisa

necessariamente voar em helicópteros.”

Kim riu. “Isso é bom. Poruqe eu nunca vou subir num helicóptero de novo

– e você não deveria também!”

Eu queria dizer a Kim que as vezes você não tem uma escolha no assunto.

A escotilha do helicóptero está aberta, e minha maca com todos os seus

tubos e linhas e carregada para dentro. Eu subo atrás dela. Um médico está

perto de mim, ainda bombeando a bolsa plástica que aparentemente está

respirando por mim. Assim que erguemos, eu entendo porque Kim ficou tão

enjoada. Um helicóptero não tem nada a ver com um avião, uma suave bala

rápida. Um helicóptero e mais como um foguete, balançando pelo céu. Para

cima e pra baixo, lado a lado. Eu não faço ideia de como essas pessoas

conseguem trabalhar em mim, conseguem ler as pequenas impressões do

computador, conseguem dirigir essa coisa enquanto se comunicam sobre mim

com fones de ouvido, como eles conseguem fazer qualquer coisa com o

helicóptero se balançando.

O helicóptero atinge uma pressão do ar e deveria ter me deixado

enjoada. Mas eu não sinto nada, pelo menos a eu que está no assento não está.

E a eu na maca não parece sentir nada também. De novo tenho que me

perguntar se estou morta mas então eu decido que não. Eles não teriam me

colocado nesse helicóptero, não estariam voando comigo pela floresta se eu

estivesse morta.

Eu posso ver a hora no painel de controle. São 10:37. Eu me pergunto

sobre o que aconteceu no chão. Willow descobriu sobre a mergencia de quem

é? Alguém ligou para meus avós? Eles vivem a uma cidade de distancia de nós, e

eu estava ansiosa para jantar com eles. Vovô pesca e ele defuma seu próprio

salmão e ostras, e nós provavelmente iríamos comer isso com o pão preto de

vovó. Então vovó iria levar Teddy para a gigante fabrica de reciclados na cidade

e deixar ele andar pelas revistas. Ultimamente, ele tem uma coisa por Reader´s

Digest¹. Ele gosta de cortar os desenhos e fazer colagens.

Eu me pergunto sobre Kim. Não tem aula hoje. Eu provavelmente não

vou na aula amanha. Ela provavelmente pensará que estou ausente porque

fiquei acordada até tarde ouvindo Adam e Shooting Star em Portland.

Portaland. Tenho quase certeza que é para lá que estou sendo levada. O

piloto do helicóptero fica falando Trauma Um. Pela janela, eu posso ver o Mont

Hood. Isso significa que Portland está perto.

Adam já está lá? Ele tocou em Seattle ontem a noite mas ele fica sempre tão

cheio de adrenalina depois de um show, e dirigir ajuda ele a se acalmar. A banca

normalmente fica feliz por deixar ele dirigir enquanto eles dormem. Se ele já

está em Portland, ele provavelmente está dormindo. Quando ele acordar, ele

foi tomar café na Hawthorne? Talvez levar um livro para o Jardim Japonês? Foi

isso que fizemos da ultima vez que fui para Portland com ele, só que estava

mais quente naquela época.

Hoje mais tarde, eu sei que a banda vai fazer a checagem de som. E então Adam

vai sair para esperar minha chegada. A principio, ele vai achar que estou

atrasada. Como ele vai saber que estou na verdade adiantada? Que eu cheguei

em Portland essa manhã enquanto a neve ainda estava derretendo?

“Você já ouviu falar de um cara chamado Yo-Yo?”Adam me pergunta. Era a

primaveira no meu ano de caloura, o que significa que era o segundo ano dele.

Naquela época, Adam esteve me observando praticar na ala musical por vários

meses. Nossa escola era pública, mas uma dessas progressivas que sempre tem

publicidade em revistas por causa de sua ênfase em artes. Tinhamos muitos

períodos livres para pintar no estúdio ou praticar música. Eu passava o meu

numa cabine a prova de som na ala de música. Adam ficava lá muito tempo

também, tocando violão. Não a guitarra elétrica que ele tocava em sua banda.

Só um violão acústico.

Eu virei os olhos. “Todo mundo ouviu falar de Yo-Yo Ma.”

Adam sorriu. Eu notei pela primeira vez que o sorriso dele era torto, sua

boca tendendo para um lado. Ele apontou o polegar em direção a quadra. “Eu

acho que você não vai encontrar cinco pessoas lá que ouviram falar de Yo-Yo

Ma. E alias, que tipo de nome é esse? É de gueto ou algo assim? Yo Mama?”

“É chinês.”

Adam balançou sua cabeça e riu. “Eu conheço muitas pessoas chinesas.

Eles tem nomes como Wei Chin. Ou Lee algo. Não Yo=Yo Ma.”

“Você não pode blasfemar o mestre,” eu disse. Mas então eu ri apesar do

que disse. Eu tinha levado alguns meses para acreditar que Adam não estava

tentando me zombar, e depois disso começamos a ter conversas pequenas no

corredor.

Ainda sim, a atenção dele me surpreendia. Não era que Adam fosse um

cara tão popular. Ele não era atleta ou um tipo mais-provavel-de-ter-sucesso.

Mas ele era legal. Legal e tocava numa banda com pessoas que iam para a

faculdade na cidade. Legal por ter seu próprio estilo roqueiro, formado por

economia em lojas e bazares, não de roubas descoladas urbanas de arrasar.

Legal por parecer completamente contente em sentar no almoço absorto num

livro, não apenas fingindo ler porque ele não tinha onde ou com quem se

sentar. Esse não era o caso. Ele tinha um pequeno grupo de amigos e um grande

grupo de admiradores.

E não era como se eu fosse uma nerd também. Eu tinha amigos e uma

melhor amiga para sentar no almoço. Eu tenho outros bons amigos no

acampamento de música que eu vou no verão. As pessoas gostam de mim o

bastante, mas eles também não me conhecem de verdade. Eu era quieta na

aula. Eu não erguia minha mão muito ou importunava os professores. E eu

estava ocupada, a maior parte do tempo gasto praticando ou tocando em um

quarteto de cordas ou indo em aulas teóricas na universidade comunitária. Os

garotos eram gentis o bastante comigo, mas tendiam a me tratar como se eu

fosse uma adulta. Outra professora. E você não flerta com seus professores.

“O que você diria se eu dissesse que tenho ingressos para o mestre?”

Adam me perguntou, um brilho em seus olhos.

“Cala a boca. Você não tem,” eu disse, empurrando ele um pouquinho

mais forte do que planejei.

Adam fingiu cair contra parede de vidro. Então ele se limpou. “Eu tenho.

No Schnitzle em Portland.”

“É o Arlene Scnitzer Hall.É parte da sinfonia.”

“Esse é o lugar. Eu tenho ingressos. Um par. Está interessada?”

“Tá falando sério? Eu estava morrendo de vontade de ir mas são tipo 80

dólares cada. Espere, como você conseguiu ingressos?”

“Um amigo da família deu para meus pais, mas eles não podem ir. Não

tem nada demais,” Adam disse rapidamente. “De qualquer forma, é sexta a

noite. Se você quiser, eu te pego as 17:30 e vamos dirigindo para Portalnd

juntos.”

“Ok,” eu disse, como se fosse a coisa mais natural.

Até sexta a tarde, no entanto, eu estava mais nervosa do que quando

sem querer bebi o café forte de papai enquanto estudava para as provas finais

no último inverno.

Não era Adam que estava me deixando nervosa. Eu fiquei confortável o

bastante ao redor dele agora. Era a incerteza. O que era isso, exatamente? Um

encontro? Um favor amigável? Um ato de caridade? Eu não gostava de estar

incerta tanto quanto não gostava de começar um novo movimento. Era por isso

que eu praticava tanto, para que eu pudesse me apresar e ter uma base solida e

então trabalhar nos detalhes dali.

Eu mudei de roupa umas seis vezes. Teddy, no jardim de infância naquela

época, estava sentado no meu quarto, tirando os livros Calvin e Hobbes das

prateleiras e fingindo ler eles. Ele estava morrendo de rir mas não sei se era por

causa das travessuras de Calvin ou as minhas deixando ele tão bobo.

Mamãe colocou sua cabeça pra dentro para checar meu progresso. “Ele é

só um cara, Mia,” ela disse quando me viu agitada.

“Yeah, mas ele é o primeiro cara com quem eu vou num talvez-

encontro,” eu disse. “Então não sei se devo usar roupas de encontro ou roupas

para sinfonia – as pessoas aqui se quer se vestem pra esse tipo de coisa? Ou eu

devo ser casual, em caso não seja um encontro?”

“Só use algo com o que você se sinta bem,” ela sugeriu. “Desse jeito você

está coberta.” Tenho certeza que mamãe teria feito todas as paradas se ela

fosse eu. Nas fotos dela com papai dos tempos antigos, ela parecia como um

cruzamento entre uma sirene 1930 e uma ciclista, com seu corte de cabelo de

duende, seus grandes olhos azuis cheios de delineador, e seu corpo magro

sempre coberto com uma roupa sexy, como uma camisola vintage junto com

uma justa calça de couro.

Eu suspirei. Eu queria poder ser tão legal. No final, eu escolhi uma longa

saia preta e um suéter marrom de manga curta. Sem graça e simples. Minha

marca registrada, eu suponho.

Quando Adam apareceu em seu terno e Creepers¹ (uma semelhança que

impressionou papai), eu percebi que realmente era um encontro. É claro, a

escolha de Adam de se vestir para a sinfonia com um terno anos 1960 podia

simplesmente o jeito legal dele de ser formal, mas eu sabia que havia mais

nisso. Ele parecia nervoso enquanto apertava a mão do meu pai e dizia a ele

que ele tinha os CD´s antigos de sua banda. “Para usar como porta copos, eu

espero,” papai disse. Adam parecia surpreso, incomodado com o pai ser mais

sarcástico do que a criança, eu imagino.

“Não enlouqueçam demais. Ferimentos sérios só na ultima peça do Yo-Yo

Ma,” mamãe chamou enquanto andávamos pelo gramado.

“Seus pais são tão legais,” Adam disse, abrindo a porta do carro para

mim.

“Eu sei,” eu respondi.

Fomos para Portland, conversando bobagens. Adam me mostrou as bandas que

ele gostava, um trio de pop suíço que soava monótono mas então uma banda

islandesa que era bem bonita. Nós perdemos no centro e chegamos no concerto

com apenas alguns minutos de sobra.

Nossos acentos eram no balcão. Perto do palco. Mas você não vai ver Yo-

Yo Ma pela vista, e o som foi incrível. Aquele homem tem um jeito de fazer o

violoncelo soar como uma mulher chorando num minuto, uma criança rindo no

próximo. Ouvir ele sempre me lembra do porque comecei a tocar violoncelo –

que tem algo tão humano e expressivo nisso.

Quando o concerto começou, eu olhei para Adam com o canto do olho.

Ele parecia natural o bastante sobre a coisa toda, mas ele ficava olhando para a

programação, provavelmente contando os movimentos até o intervalo. Eu me

preocupei de que ele estivesse entediado, mas depois de um tempo eu fiquei

muito presa na música para me importar.

Então, quando Yo-Yo Ma tocou “Le Grand Tango,” Adam se esticou e

pegou minha mão. Em qualquer outro contexto, isso teria sido brega, o velho

movimento de bocejar e apalpar. Mas Adam não estava olhando para mim. Seus

olhos estavam fechados e ele estava levemente inclinado em seu assento. Ele

também estava perdido na música. Eu apertei a mão dele em resposta e ficamos

sentados daquele jeito pelo resto do concerto.

Depois, compramos café e donuts e andamos pelo rio. Estava nublado e

ele tirou seu terno e colocou nos meus ombros.

“Você não conseguiu aqueles ingressos com um amigo da familia,

conseguiu?” eu perguntei.

Eu pensei que ele iria rir e ergueu seus braços para cima em uma

rendição zombadora como ele fazia quando eu o provocava numa discussão.

Mas ele olhou direto para mim, então eu pude ver os tons verde marrom e cinza

se misturando em sua Iris. Ele balançou sua cabeça. “Isso foram duas semanas

gorjeta de entregas de pizza,” ele admitiu.

Eu parei de andar. Eu podia ouvir o barulho da água. “Porque?” eu

perguntei. “Porque eu?”

“Eu nunca vi ninguém ficar tão preso na música como você. É por isso

que gosto de ver você praticar. Você fica com a ruga mais fofa na sua testa, bem

aí,” Adam disse, me tocando acima do nariz. “Sou obscecado com música e

mesmo eu não sou transportada como você é.”

“Então, o que? Sou como um experimento social para você?” Eu queria

que fosse uma brincadeira, mas saiu soando amargo.

“Não, você não é um experimento,” Adam disse. Sua voz era rouca e

sufocada.

Eu senti o calor subir por meu pescoço e eu podia me sentir corando. Eu

encarei meus sapatos. Eu sabia que Adam estava olhando para mim agora com

tanta certeza que eu sabia que se olhasse para cima ele iria me beijar. E fiquei

surpresa por o quanto eu queria ser beijada por ele, para perceber que eu

pensei nisso com tanta freqüência que memorizei o formato exato dos lábios

dele, que eu imaginava passar meus dedos pelo queixo dele.

Meus olhos se ergueram. Adam estava esperando por mim.



E foi assim que começou.

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