Fazer sucesso no YouTube não é tão difícil. Claro, não é a coisa
mais fácil que existe, afinal de contas milhões de vídeos são enviados diariamente
e só uma pequeníssima parcela deles atinge 100 mil visualizações. Porém, ainda
assim, é muito mais fácil conseguir um vídeo de sucesso no YouTube do que em
qualquer outro lugar. Isso porque a ferramenta é 100% livre e disponível. As
pessoas podem assistir a qualquer momento, podem divulgar e gerar a própria
“viralização” do conteúdo, além do próprio site proporcionar a divulgação do
material para as pessoas que frequentam ou assinam, diferentemente de todos os
outros veículos tradicionais, como TV, rádio e cinema.
O problema não está em conseguir fazer sucesso com um vídeo no YouTube,
mas, sim, em manter esse padrão. Dezenas de exemplos se destacam quando
pensamos em vídeos que ficaram famosos: Jeremias Muito Louco, Dona Sônia,
Gaga de Ilhéus, Travesti Bagunça, Morre Diabo, Tapa na Pantera, Pedro me Dá
meu Chip, Dança do Quadrado, Avassaladores “Sou Foda”, entre tantos outros
que garantiram milhões de acessos e explosão momentânea como assunto nos
encontros entre jovens no Brasil. A questão é: de todos os que já haviam atingido
tal patamar, qual deles conseguiu produzir outro vídeo de sucesso?
A grande dificuldade está exatamente em repetir o sucesso de determinado
vídeo. Muitas vezes acertamos a fórmula em um, mas isso não garante que outros
conseguirão manter a mesma média. Era exatamente isso que passava em minha
mente após observar que o “Não Faz Sentido – Gente Colorida” já estava perto
de atingir 1 milhão de visualizações em tão pouco tempo. Um milhão! Aquilo
significava que quase 1 milhão de pessoas tinha me assistido e, a julgar pela
aprovação (95% de “gostaram”), a exigência para os próximos seria avassaladora
(dig djin dig djin).
Esse foi o período que determinou de vez a imagem do Não Faz Sentido que
as pessoas enxergam até hoje.
O que eu tinha na minha frente era uma possibilidade de atingir algo jamais
atingido no país. Um vídeo batendo 1 milhão de acessos e uma fórmula que tinha
tudo para fazer com que outros vídeos garantissem o mesmo número. As únicas
coisas que eu precisava era de temas interessantes, roteiros e interpretações
sinceras, que refletissem exatamente o que eu pensava, só que com uma pegada
interpretativa bem agressiva.
Ao mesmo tempo em que tentava pensar inteiramente no Não Faz Sentido, até
porque meu entusiasmo não permitia que eu pensasse em mais nada, muita coisa
estava acontecendo na minha vida pessoal. Falta de grana, preguiça de seguir na
minha carreira como designer gráfico, desejo imenso de retornar para o teatro,
ausência total de vontade de escrever no blog (que eu abandonara por completo)
e vida emocional zerada, sem qualquer possibilidade de novo relacionamento. Em
suma: estava meio que na merda, colhendo os frutos do péssimo ano de 2008,
mesmo já estando lá por meados de abril de 2010.
A questão é que continuar com esse foco total no Não Faz Sentido poderia
acabar resultando no meu fracasso por completo. O blog perdia cada vez mais
acessos, eu não trabalhava mais como designer e financeiramente estava
quebrado. A opção de abandonar o pouco que tinha e investir numa ideia que
tinha 99% de chances de dar errado era a mais insana a ser tomada, mas
sinceramente? Nunca fui muito de seguir o conforto e o que é seguro. Não foi à
toa que nunca quis fazer faculdade, arranjar um emprego e viver na normalidade.
Desde pequeno eu já parecia ter noção de que meu futuro seria glorioso ou
trágico e, muito embora você esteja lendo meu livro neste momento, nada impede
que a tragédia ainda venha aparecer na história da minha vida. Quem sabe ainda
irei terminar participando de reality show e, no final de tudo, quando não
sobrarem alternativas, fazendo filme pornô? Vai saber... Só prometo que travesti,
não. Vale ressaltar, contudo, que, por mais que nunca tenha sentido, a real intenção
era de seguir a vida de trabalhador normal. Fiz 1 ano de faculdade de Desenho
Industrial (na época pensando em seguir no Design), 1 ano no profissionalizante
de Teatro e mais 1 ano na faculdade de Direito (essa última que decidi entrar
apenas por estar querendo estudar coisas novas).
É curioso lembrar mas, por mais que tudo indicasse que eu tinha reais chances
de me dar muito mal ao abandonar tudo para investir todo o meu tempo no Não
Faz Sentido, sentia uma certeza quase absoluta de que tudo daria certo. Lembro
responder a conselhos familiares dizendo: “Calma, espera e vê, confia em mim.”
Era apenas um jovem adulto falando um monte de bobagens, mas de alguma
forma eu conseguia realmente sentir que algo envolvia aquele projeto. Algo iria
acontecer. Decidi seguir em frente com toda a força.
O que me faltavam eram temas. O vídeo “Gente Colorida” dera certo por uma
combinação de dois fatores: verdade no que eu dizia (pelo menos verdade pra
mim) e uma temática adolescente que gerava concordância e revolta. O que eu
faria a seguir, então?
Ora, vamos combinar? Quem define a internet são os jovens. Dificilmente
você verá algo que faz sucesso somente entre os adultos virando um fenômeno na
web. É assim desde que o mundo é mundo. Para conseguir fazer com que sua
banda seja um estouro, você precisa agradar aos jovens. Para conseguir fazer com
que sua carreira de ator seja um estouro, lá estão os jovens precisando ser
agradados. São os jovens que montam fã-clubes, que ficam enlouquecidos
acompanhando cada passo do artista, que colam fotos nas paredes e berram “EU
TE AMO!!!”
Contudo, devo ser sincero que não enxerguei isso inicialmente. Na realidade,
os jovens refletiam as coisas que mais me incomodavam. É óbvio que isso é um
clichê. É óbvio que toda geração não suporta a geração seguinte, ou vocês acham
que minha mãe achava o máximo eu ouvindo É o Tchan, vendo no programa do
Sílvio Santos meninas de 8 anos rebolando até o chão com um microshort enfiado
na bunda tentando copiar a Carla Peres, assistindo a desenhos violentíssimos e
cheios de sangue, além de escutar Raimundos aos 11 anos e ficar cantando pela
casa: “Entrei no trem, esporrei na manivela, o cobrador filha da puta me jogou
pela janela”?!
A questão é que, mesmo sendo um clichê, os jovens de hoje em dia de fato me
incomodavam em diversos aspectos. Sua falta de atitude, fofuxismo exacerbado,
total desligamento de aspectos sociais, adoração de músicas idiotas com letras
patéticas e ritmos decepcionantes... Enfim, diversos aspectos da galerinha que em
muito me importunavam (e ainda importunam).
Como o Não Faz Sentido dependia de que meus roteiros fossem sinceros e
refletissem meus reais pensamentos, acabei decidindo seguir por esse caminho:
falar absolutamente tudo o que me incomodava nos jovens daquele momento.
Agora parem por dez segundos para pensar no quão burra poderia ter sido essa
ideia. Os jovens ditam o que dá certo, são o termômetro do que realmente faz
sucesso, principalmente na internet, e eu, no alto de minha ignorância, estava indo
contra eles, colocando o dedo na cara e apontando tudo que considerava errado
nos adolescentes. Ainda tem gente que diz até hoje que a única razão pela qual
selecionei os temas a serem criticados foi porque queria fazer sucesso. Se essa
fosse a única intenção, eu deveria ser realmente muito idiota. Ou muito genial em
conseguir prever que, falando mal dos jovens, eu garantiria o apoio justamente
deles.
Na realidade eu não era nenhuma das duas coisas, mas, sim, apenas um rapaz
querendo falar o que pensava. Parece bobo e até mesmo enganador, mas não
poderia sair inventando mentiras neste livro, dizendo que tudo foi previsto, ou
que na real eu não tinha qualquer intenção de sucesso. Ambas as afirmações
seriam mentirosas. Eu fazia os vídeos pensando, sim, nas exibições (caso
contrário, como já disse, não estaria publicando na internet, mas guardando em
meu acervo pessoal), mas em contrapartida não selecionava os temas prevendo
que iriam agradar.
Fiz o que fiz por só ter um caminho: precisava falar o que considerava
verdade. Selecionei os temas baseado no que mais me incomodava na época. As
únicas razões foram essas. E poderia ter dado tudo errado, eu poderia ter
incomodado muito mais que agradado e, por consequência, o Não Faz Sentido
teria terminado ainda naquela época. Contudo, a resposta foi absolutamente
contrária.
Quanto mais eu dizia o que pensava sobre a adolescência, como fiz nos vídeos
seguintes: “Sub-Celebridades”, “Vida de Garoto” e “Justin Bieber”, mais e mais
pessoas ficavam viciadas no Não Faz Sentido. Ao mesmo tempo em que eu
gerava o ódio mortal de muitos adolescentes, outros aplaudiam e disseminavam
sem parar. Os adolescentes em peso ficaram sabendo da existência do canal, fosse
por concordar ou simplesmente odiar. Ambos os lados divulgando sem parar. Os
que gostavam, divulgavam para os amigos. Já os que odiavam, divulgavam para
todos alucinadamente, na tentativa de fazer com que outros me xingassem. O
resultado, contudo, foi totalmente positivo.
Sem pensar muito, havia cutucado um formigueiro. Sabe? Quando você mexe
e de repente milhões e milhões de formigas saem correndo em todas as direções?
O Não Faz Sentido teve mais ou menos esse efeito, só que com a galerinha
jovem.
Para melhorar ainda mais o cenário, os pais das crianças começaram a ficar
sabendo de um tal de Felipe Neto que falava mal de tudo e, quando perceberam o
conteúdo dos vídeos, deram ainda mais apoio. Comecei a receber e-mails de pais
dizendo que os vídeos possuíam um teor quase educativo, que passavam aos
jovens mensagens de incentivo à busca pela educação e ao estudo, em vez de
engolirem qualquer coisa bonitinha que fazia sucesso.
Curiosamente, essa também não era minha intenção. No início, não fazia ideia
da quantidade de visualizações que teria, logo não calculava o efeito que poderia
ter entre os jovens. Minhas mensagens não eram planejadas imaginando uma
valorização do pensamento, ou de qualquer outra coisa. Eram apenas palavras
sinceras refletindo aquilo que eu pensava.
Sem dúvida o vídeo do Justin Bieber foi um marco para o canal. Fica quase
impossível falar da história do Não Faz Sentido sem dedicar algumas linhas ao
astro pop mirim que, curiosamente, também nasceu no YouTube (talvez você não
saiba, mas Justin fez muito sucesso na internet antes de ir para os palcos).
Eu já havia produzido dez vídeos no canal, dentre os quais destacavam-se
“Sedução e Cantadas”, “Gente Colorida”, “Sub-Celebridades” e “Vida de
Garoto”, este último falando sobre uma moda adolescente na época, os tais
Colírios da Capricho, um grupo de jovens meninos supervalorizados por seus
dotes de beleza (baseada em padrões meio cômicos, como os cabelos grandes
colocados de lado na testa e os olhos amendoados como transmitindo uma
mensagem quase que “zeeenti eu uso rímel”). A média de visualizações já estava
em torno de 1 milhão por vídeo, tendo o “Gente Colorida” já perto de 2 milhões.
O que aconteceu foi simplesmente isso: escutei uma música do Justin Bieber,
achei uma porcaria. Em seguida procurei saber sobre esse astro jovem que estava
fazendo até mesmo crianças gravarem vídeos chorando alucinadamente
mandando mensagens de “eu te amo”.
Descobri coisas meio absurdas, como o fato de que ele planejava fazer um
filme sobre sua vida, mesmo tendo apenas 16 anos. Li uma entrevista em que ele
dizia que o maior sofrimento de sua vida havia sido o dia em que seu hamster
morreu. Encontrei uma lista oficial que divulgava as 100 artistas femininas mais
pesquisadas no Google e descobri que Justin Bieber ocupava a sétima posição.
No final, ainda achei outra matéria revelando que uma menina estava sendo
ameaçada de morte pelas fãs apenas porque ele havia publicado uma foto no
Twitter ao lado dela.
Tudo isso configurou material suficiente para eu elaborar um roteiro para o
vídeo. Acredito que esse tenha sido provavelmente o texto mais fácil que escrevi.
Dez minutos de pesquisa, mais dez para escrever e já estava na frente da câmera
dizendo tudo o que pensava sobre o rapaz.
BUUUUUUM!
Eu não tinha a menor ideia de realmente quantas pessoas eram fãs do garoto.
Só sei que, meia hora depois de postar o vídeo, o termo “Felipe Neto” já era líder
dos trending topics do Twitter mundial, onde ficou por mais dois dias inteiros. As
fãs, completamente revoltadas, divulgaram o vídeo com todo o fervor que seus
pequenos corpos eram capazes de sentir. Por consequência, em cinco dias o vídeo
já ultrapassara a marca de 1 milhão e subia vertiginosamente a cada momento.
Além disso, graças ao Twitter, outras milhares de pessoas foram se informar
sobre quem diabos era aquele tal “Felipe Neto” liderando os trending topics
mundiais por tanto tempo.
Esse momento foi um verdadeiro divisor de águas para o Não Faz Sentido. Foi
a consolidação absoluta de que, realmente, tratava-se de um canal de sucesso no
número de visualizações e em repercussão nacional. Já eram mais de dez vídeos,
cada um com mais de 1 milhão de visualizações, além de se tratar do grande
assunto do Twitter, no qual eu já somava mais de 100 mil seguidores, aparecendo
na lista dos brasileiros com maior número de seguidores no mundo, na época.
Algumas pessoas me perguntam como eu poderia listar “bandas adolescentes”,
astros mirins do pop e gente superficial como as coisas que mais me
incomodavam na época, em vez de falar sobre política, religião ou outros
assuntos mais densos e complexos. Bem, a resposta é simples: eu não estava
levando o Não Faz Sentido a sério. É claro que, se eu fosse listar as coisas que
mais me incomodavam, faria vídeos falando sobre corrupção, fome, miséria e
pombos (sim, pombos me irritam), mas eu tratava o Não Faz Sentido como uma
grande brincadeira em que eu falava sobre questões mais superficiais que me
incomodavam. Além disso, os temas que comentei estavam muito mais presentes
em meu cotidiano que os demais. Você sabe que existe a fome, mas ela não toca
no rádio. Minha inspiração vinha do que me irritava no dia a dia e a consequência
foi essa.
A conclusão disso tudo? Eu, que tanto falara contra modas adolescentes, havia
me tornado uma.
acesse os vídeos mencionados neste capítulo:
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